domingo, dezembro 31

Um Bom 2007





A todos os que nos lêem, nos lêem e comentam, ou connosco colaboram enviando textos, fotos ou e-mails, a equipa do "conversas de xaxa 4" agradece, e convida a beber uma taça de champanhe ("virtual", pois os "trocos" que nos deixam na carteira não dão para mais) fazendo votos para que, pelo menos, se realizem a maior parte dos vossos desejos.

FELIZ ANO NOVO !

sexta-feira, dezembro 29

Novas luzes





















Revejo-me nos novos espaços que te abro.
Portas escancaradas à espera da tua voz.
Espero-te...

Beberemos juntos
o néctar que guardei para festejar
o começo de uma nova vida.

Agora, apenas resta que chegues
e a noite será iluminada
pelo desejo
pelos beijos
pelo amor.

Partamos, pois, ao encontro
de um novo presente.

Abandono-me...
E o desejo é o nosso futuro.

(Foto: Victor Melo)

quinta-feira, dezembro 28

O PORTO : O MORRO E O RIO - 1° EPISÓDIO (à margem de uma filmagem)

1º EPISÓDIO

Entrei na Rua de Sant’Ana, possivelmente a mais antiga da Cidade, como se entra num lugar de veneração. Para minha vergonha, era a primeira vez. Mas como tudo, na vida, tem um lado positivo, o ser agora a primeira vez trazia acumulada uma série de encantos que há décadas atrás me passariam ao lado.
Cheguei ali devagar, como se de peregrinação se tratasse. Entrara no Morro pela Calçada de Vandoma. Ouvi os sinos da Sé. E percorri toda a Rua D. Hugo, nobre e misteriosa como ele próprio terá sido. A meio, parei no início das Escadas das Verdades, antes chamadas das Mentiras, possivelmente a primeira ligação do Morro ao Rio.
Depois, deliciado, até comovido, senti o velho coração do Porto, onde tantas gerações conviveram, tão dificilmente – e tão perto – com o forte poder episcopal, dono e senhor da cidade até 1405: S. Sebastião, Pena Ventosa, Aldas, Bainharia, Mercadores.
Ruas estreitas, íngremes, severas, mas enfeitadas, porque de vésperas de S. João se tratava. Com música à mistura, saindo não sei por onde. Mais do que as percorrer, fiz parte delas.


No início da Rua de Sant’Ana falei pela primeira vez:

«O arco, o célebre arco que inspirou Almeida Garrett, situava-se aqui. Mas foi demolido em 1821, juntamente com a Porta de Sant’Ana, uma das 4 Portas da Cerca Velha. Neste nicho, ou oratório, venerou-se a imagem de Sant’Ana, hoje recolhida no Museu de Arte Sacra, uma das dependências do Convento dos Grilos.»
E segui pela Rua fora, com o cenário da fachada da Igreja de S. Lourenço a revelar-se lentamente, como se quisesse defender-se de olhares que não a merecessem.


E só no Largo do Colégio se mostrou, com toda a sua majestade.

E aqui voltei a falar:

«O Convento foi fundado em 1560 pelo Cardeal D. Henrique. Vendido em 1798 aos Agostinhos Descalços, designados por Grilos, por provirem do Convento do Grilo, em Lisboa. E é por Grilos que tudo ficou conhecido.
Três portas. Portal de colunas coríntias geminadas, a enquadrar o símbolo da Companhia de Jesus. Lá em cima, Brasão com as armas de Frei Luís Álvares de Távora, que contribuiu generosamente para a realização da obra – único brasão que escapou à destruição dos símbolos dos Távoras, ordenada pelo Marquês de Pombal que os mandou picar a todos. Deste, pelos vistos, esqueceu-se.»

Mas eu não me vou esquecer de continuar a contar esta peregrinação pelo Centro Histórico do Porto, desde que pressinta que não vou só. Com episódios curtos.
E, já que estou no Largo do Colégio, por aqui ficarei no próximo episódio, porque há muito para ser contado.

(continua)

Artigo da autoria de Fernando Novais Paiva



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quarta-feira, dezembro 27

O Porto: o morro e o rio


(óleo de Dordio Gomes)

Um meu amigo, portuense dos "sete costados" e profundo conhecedor do PORTO, da sua história, dos seus monumentos e dos seus recantos, resolveu fazer com muito tempo e trabalho investidos, dois DVDs que muito apreciei.
Contamos nos nossos "links" vários blogs de portuenses que, tanto como o Fernando Novais Paiva, adoram a "sua" cidade. Assim, depois de alguma conversa, consegui que ele acedesse a publicar duas vezes por mês, mas sem data fixa, alguns extractos dos referidos DVDs.
Espero que seja do vosso agrado, como é do meu e os meus agradecimentos ao Paiva pela sua disponibilidade em colaborar connosco.

Peter

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terça-feira, dezembro 26

Natal sem sinos

No pátio a noite é sem silêncio
e que é a noite sem o silêncio?
A noite é sem silêncio e no entanto onde os sinos
do meu Natal sem sinos?

Ah meninos sinos
de quando eu menino!

Sinos da Boa Vista e de Santo António.
Sinos do Poço, do Monteiro e da Igrejinha de Boa Viagem.

Outros sinos
Sinos
Quantos sinos!

No nocturno pátio
sem silêncio, ó sinos
de quando eu menino.
Bimbalhai meninos.
Pelos sinos
de quando eu menino,
pelos sinos (sinos
que não ouço), os sinos de
Santa Luzia.

Rio, 1952

( Manuel Bandeira )

Publicado no blog “agrestino”, de Manoel Carlos http://www.agrestino.blogger.com.br
que consta dos “links” na referência Manoel Carlos.
Penso ser adequado ao dia a seguir ao Natal, até porque ainda estou de “ressaca” …

Infelizmente os Natais já voltaram a desabar em cima de mim…

quinta-feira, dezembro 21

FELIZ NATAL


So this is Christmas
and what have you done
another year over
a new one just begun

and so this is Christmas
I hope you have fun
the near and the dear ones
the old and the young
a very Merry Christmas
and a Happy New Year
let's hope it's a good one
without any fear

and so this is Christmas (war is over...)
for weak and for strong (...if you want it)
the rich and the poor ones
the road is so long

and so happy Christmas
for black and for white
for the yellow and red ones
let's stop all the fight

a very Merry Christmas
and a Happy New Year
lets hope it's a good one
without any fear

so this is Christmas
and what have you done

war is over - if you want it
war is over - if you want it
war is over - if you want it
war is over - if you want it

jonh lennon (merry christmas - war is over)



(p.f. pare a música antes de clicar no play do vídeo)



A Todos os que nos visitam !
(depressivos e não-católicos incluídos... jack nightmare )

A ceia de Natal


Carl Larsson, "The Christmas Eve", watercolor.

"Esta é indubitavelmente uma época de hipocrisia colectiva, ou quase colectiva: lembram-se os familiares esquecidos durante uma boa parte do ano, reivindicam-se valores inexistentes, olha-se o sem-abrigo de soslaio fingindo que se lhe presta alguma atenção. Isso não impede que continuemos a alhear-nos da sua presença. Incómoda presença. Fingimos igualmente que as guerras não existem, que crianças não morrem de desnutrição, que medicamentos que deitamos fora, salvariam milhares de vida."

(António Pinto Correia)

quarta-feira, dezembro 20

Mude e Marque (M & M)


De há uns anos para cá, a minha sensação é a de que os Natais estão chegando cada vez mais rapidamente.

Num texto que chegou até mim, enviado por mão amiga, encontrei a solução. Trata-se dum texto brasileiro, que eu adaptei, mas que, muito possivelmente, deve circular aí pela Net. Não importa, eu não o conhecia e posso afirmar, por experiência própria, que o que se diz é pura realidade.
Infelizmente os Natais já voltaram a desabar em cima de mim…

“Se alguém o colocar dentro de uma sala branca vazia, sem nenhuma mobília, sem portas ou janelas, sem relógio, por alguns dias a sua mente detectará a passagem do tempo sentindo as reacções internas do seu corpo, incluindo os batimentos cardíacos, ciclos de sono, fome, sede e pressão sanguínea. Depois começará a perder a noção do tempo.

Isso acontece porque a nossa noção de passagem do tempo deriva do movimento dos objectos, pessoas, sinais naturais e da repetição de eventos cíclicos, como o nascer e o pôr-do-sol. Mas há outra coisa que tem de considerar: o nosso cérebro é extremamente optimizado: ele evita fazer duas vezes o mesmo trabalho.
Um adulto médio tem entre 40 a 60 mil pensamentos por dia. Qualquer um de nós ficaria louco se o cérebro tivesse que processar conscientemente tal quantidade. Por isso, a maior parte destes pensamentos é automatizada e não aparece no índice de eventos do dia e portanto, quando você vive uma experiência pela primeira vez, ele dedica muitos recursos para compreender o que está acontecendo.

É quando você se sente mais vivo. Conforme a mesma experiência se vai repetindo, ele vai simplesmente colocando as suas reacções no modo automático e "apagando" as experiências duplicadas.
Aí está porque parece que o tempo acelera quando ficamos mais velhos e porque os Natais chegam cada vez mais rapidamente…

Conforme envelhecemos, as coisas começam a repetir-se, as mesmas ruas, pessoas, problemas, desafios, programas de televisão, reclamações...enfim... as experiências novas (aquelas que fazem a mente parar e pensar de verdade, fazendo com que o seu dia pareça ter sido longo e cheio de novidades), vão diminuindo.
Até que tanta coisa se repete que fica difícil dizer o que tivemos de novidade na semana, no ano ou, para algumas pessoas, na década. Por outras palavras, O QUE FAZ O TEMPO PARECER QUE ACELERA É A ROTINA.

A rotina é essencial para a vida e optimiza muita coisa, mas a maioria das pessoas ama tanto a rotina que, ao longo da vida, o seu diário acaba sendo um livro de um só capítulo, repetido todos os anos.

Felizmente há um antídoto para a aceleração do tempo: M & M ( Mude e Marque).

MUDE, fazendo algo de diferente: escolha roupas diferentes, troque a cor do cabelo, deixe crescer a barba, rape a barba, e MARQUE com fotos, postais e cartas, ou fazendo uma festa.

Porque se você viver intensamente as diferenças, o tempo vai parecer mais longo. “

segunda-feira, dezembro 18

Contrastes



ESPAÇO

STS-116 Shuttle Mission



LISBOA

Parque do Areeiro

domingo, dezembro 17

Ricos, remediados e pobres 4


A grande maioria dos considerados "pobres" eram os trabalhadores rurais e é sobre eles que vou falar.
Trabalhavam "de sol a sol", isto é, pegavam ao nascer do sol e largavam ao pôr. Ao meio dia era o intervalo para jantarem e, quando regressavam a casa ceavam. Levavam sempre consigo um quarto de pão com algumas azeitonas, por vezes um pedaço de toucinho, que iam petiscando quando a fome apertava. Normalmente usavam uma samarra feita de pele de borrego, ou um gabão de serapilheira.
Eram contratados e serviam até o patrão os mandar embora por já não renderem, ou por qualquer outro motivo. Se estavam doentes iam para o hospital, não tinham férias, como não tinham qualquer reforma. Por vezes os filhos conseguiam ficar no lugar do pai e as filhas iam servir como criadas em casa dos patrões, onde comiam e dormiam, mas para elas todos os dias eram iguais: não havia sábados nem domingos. Como é óbvio, quando casavam iam-se embora.

Durante as ceifas surgiam os chamados “ratinhos”, pessoal oriundo das Beiras e que vinha trabalhar em situações degradantes e por jornas mais baixas, o que agradava aos patrões e desagradava aos trabalhadores locais, àqueles que não se encontravam ao serviço de um lavrador, mas iam oferecendo os seus serviços à jorna a quem deles precisava.

Os lavradores mais ricos tinham uma pessoa que lhes fazia as contas e que acumulava com outro emprego de escritório, ou na Fábrica de Moagem, ou na Câmara Municipal. Os trabalhadores dirigiam-se a essa pessoa quando precisavam de dinheiro, ou para levantarem um porco, um borrego pela Páscoa, ou farinha. As contas eram feitas pela Feira da Luz, onde poderia haver despedimentos, ou novas contratações.

E assim cheguei ao fim das minhas recordações de infância, com as quais pretendi dar uma ideia do antigamente, por quem o viveu. Depois do 25 de Abril de 1974 a vida melhorou substancialmente, bem como a vila progrediu e se expandiu.

Fico satisfeito por isso. Fico satisfeito por ter dado a minha pequena contribuição para que tal fosse possível.

sábado, dezembro 16

Natal em Lisboa



A árvore de Natal mais alta da CEE





O índice de vida mais baixo da CEE

(Foto Peter)

Ricos, remediados e pobres 3

O mercado era na praça principal, a da Câmara, mas ali não se vendia peixe por ser raro haver, não só pelos hábitos alimentares dos alentejanos: "peixe não puxa carroça", ou "Jesus Cristo encarnou, não empeixou", como por ser difícil fazê-lo chegar em boas condições, pelo que se destinou à sua venda uma pequena dependência normalmente fechada.
Quando havia peixe, um pregoeiro, do cimo das ladeiras da vila, dava conhecimento do facto à população. Também anunciava todo e qualquer assunto que fosse do interesse geral, como a realização de uma sessão de cinema.

O cinema chegava numa viatura e montava-se uma enorme tela na Praça acima citada. Uma hora antes de começar a sessão, a população interessada deslocava-se para lá, cada pessoa levando a sua cadeira, ou mocho. Eu levava normalmente um mocho, por ser menos pesado. Os filmes, de que já não me lembro os nomes, eram sempre os mesmos, mas era o que havia e serviam para quebrar a monotonia e passar o tempo. Um era sobre o 28 de Maio do qual relembro apenas a letra da música: “os marinheiros/ aventureiros/ são sempre os primeiros/ na terra ou nos mares/ ao verem as belas/ pelas janelas/ colhem logo as velas/ para as conquistar”
O outro filme era sobre a Guerra Civil de Espanha e referia-se ao episódio da resistência oferecida pelos franquistas à conquista do Alcazar de Toledo, na altura uma Escola Militar de futuros oficiais do Exercito Espanhol. Tudo propaganda Salazarista e Franquista.

As mercadorias, bem como o correio, chegavam pelo caminho de ferro, ou pelas duas empresas de camionagem. A Estação da CP fora construída a 5 kms da vila para que o traçado do caminho de ferro não afectasse as herdades dum rico proprietário. As pessoas tinham que palmilhar o caminho, já que só havia uma carroça que ia buscar o correio e que cobrava dinheiro a quem levava, mas onde não cabiam mais de seis e mal instaladas.
As carreiras de camionagem eram a Setubalense, que garantia a ligação com Lisboa e a do Capucho que assegurava a ligação com Évora. A chegada das camionetas à Praça era um acontecimento. Todos os "basbaques" iam ver a sua chegada e admirar as viajantes.
A solução encontrada para a escassez da gasolina, motivada pela crise internacional durante a segunda guerra mundial, foi a utilização de veículos movidos a gasogénio, combustível mais barato. Para ser instalado, o gasogénio requeria um equipamento acoplado na traseira dos veículos, onde se colocava carvão vegetal que, ao queimar-se, produzia um gás combustível constituído principalmente por monóxido de carbono. Isto é: em vez de gasolina ou gasóleo, andava-se a água e carvão. Talvez seja a solução para os dias de hoje…


(http://forum.autohoje.com)

Quando chegou a altura de ir para a escola lá fui. Eu era dos privilegiados, pois tinha botas, mas muitos iam descalços. Com aquele frio, todos tínhamos frieiras.
Os filhos dos ricos não a frequentavam. Tinham professoras em casa e depois só lá iam fazer o exame da 3ª classe. Era obrigatória a frequência da escola até à 3ª classe, mas, ainda comigo lá, veio uma determinação do Governo a tornar obrigatória a sua frequência até à 4ª classe, com um exame final. Esta determinação gerou uma onda de protesto entre os lavradores porque, diziam eles, ficavam sem "ajudas" para o gado, isto é, os pastores deixavam de ter quem os ajudasse (gratuitamente) no pastoreio.
Após o exame da 4ª classe, a maior parte dos alunos ficava-se por ali, pois ainda havia que fazer o "exame de admissão", como se chamava, para ingresso no ensino secundário. Era extremamente difícil e muitos faziam o exame de 4ª classe num ano e o exame de admissão no outro.
Depois, os mais ricos iam para um colégio em Santo Tirso, ou para Santarém. Dos remediados, a maior parte ia para o Liceu de Évora, para a Escola de Regentes Agrícolas (Mitra), ou para a Escola Comercial e Industrial, conforme a profissão e as posses dos pais. Era caro prosseguir os estudos, pois a falta de ligações com Évora, ou melhor a inexistência de horários adequados, obrigava os alunos a ficarem alojados num quarto da cidade.

(continua)

quinta-feira, dezembro 14

Ricos, remediados e pobres 2

Na vila havia duas "grandes" famílias, ou melhor, dois "nomes", que através dos casamentos entre eles e dos irmãos e primos, eram os proprietários da quase totalidade das terras do Concelho. Eram os grandes empregadores e para eles trabalhavam nas suas terras a quase totalidade dos pobres.
Mais à frente falaremos das condições em que esse trabalho era prestado.
Uma dessas famílias designava o Presidente da Câmara, que se manteve nessas funções anos e anos, acabando por levar um "pontapé para cima", pois passou a Governador Civil de Évora e, para azar dele, era naquelas funções que se mantinha quando foi o 25 de Abril de 1974.
Enquanto exerceu as funções de Presidente da Câmara da vila, não dei por se terem feito quaisquer obras na mesma.

O padre, o professor primário e o Cabo da GNR, gozavam dum estatuto especial. Havia também o regedor, mas ninguém lhe ligava nenhuma.

Nos "remediados", ou seja na "classe media", podíamos considerar três grupos:

- Os pequenos lavradores, normalmente donos de uma herdade e que traziam mais uma ou duas de renda. Incluímos aqui os feitores dos lavradores ricos, que dispunham de "carta branca" para administrar, comprar e vender cereais e gado, bem como contratar e despedir trabalhadores rurais. Estão a ver ...
- Os logistas, artífices proprietários de oficinas, ou não, e os donos dos cafés. Havia três cafés, dois frequentados pelos remediados e o outro pelos ricos. O proprietário deste último não era um "salazarista" e, por isso, chegou a ter chatices. O decano de uma dessas "famílias", era já bastante idoso e muito curvado, usando uma bengala. Um dos meus primos chamava-lhe o "ti stick", devido à sua postura. Só bebia água do Luso, pensava ele, pois o proprietário do café, piscando-nos o olho, dizia-nos:
"Queres água do Luso, não é? Bebes água da torneira e pagas como se fosse Luso". Convém esclarecer que, nesse tempo, só havia garrafões, de modo que, nos cafés, a água era vendida a copo.
Nesse café, que tinha fabrico próprio, faziam dois bolos, um a que chamavam "salazares" e outro a que chamavam "jesuítas". Quando alguém de fora lhe perguntava qual a diferença entre os dois, pois ambos tinham o mesmo aspecto, a resposta era invariavelmente a mesma: "são os dois da mesma massa".
Num dos cafés dos remediados, que se situava na Praça da Câmara, reuniam-se de preferência os caçadores.
No outro, situado quase frente ao dos ricos, reuniam-se os “esperantistas”. É certo que o introdutor do interesse pela língua, era um notório opositor ao Governo, mas eu naquela altura, não só não percebia o elevado número de interessados na aprendizagem do “Esperanto”, nem a sanha com que os mesmos eram vigiados pela PIDE.
Só três cafés, perguntarão? Sim, o resto eram tabernas, frequentadas pelos pobres, que ali se entretinham jogando "sueca" ou dominó, nos seus tempos livres, que praticamente não existiam, mas havia os desempregados (que bebiam "fiado") e os que já não podiam trabalhar.
- Os empregados na Câmara e outros organismos do Estado e, mais tarde, os de uma Fábrica de Moagem, que passou a fornecer electricidade à vila, substituindo os candeeiros a petróleo e o “tipicismo” do homem que os acendia, acompanhado por um ajudante que carregava a escada.

(continua)

quarta-feira, dezembro 13

Ricos, remediados e pobres


Na 2ª metade do século passado era esta a estratificação social no Alentejo. Os ricos eram os lavradores, donos de herdades (“montes”, como lhes chamávamos) que faziam gala no “nome” e casavam os filhos entre si. Normalmente os casamentos eram ajustados nos luxuosos bailes que organizavam em Évora no “Clube” e nos quais só era permitida a entrada em trajes de gala.
Era ali em Évora que todas as 3ªs Feiras, no Café Arcada, os lavradores da região se reuniam para negociar. Nós, os estudantes, chamávamos-lhe “o dia de S.Porco”. Lembro-me dum facto verídico que ali se passou e que passo a relatar:
- um indivíduo podre de rico, chamavam-lhe “o Descalço”, excêntrico e sem se importar com o seu aspecto ou com o que vestia (não andava de capote, mas sim de gabão que era o usado pelos trabalhadores rurais) entrou e sentou-se à mesa do café. Um criado, novo na casa, acorreu a pô-lo na rua. Mas o gerente, que sabia bem de quem se tratava, veio solícito arranjar-lhe uma mesa e até lhe foi buscar uma cadeira, desfazendo-se em mil desculpas. O “Descalço”, que até certo ponto era um filósofo, sentou-se na cadeira trazida pelo gerente do café, dizendo:
- “senta-te meu dinheiro, que o homem nada vale”.
Também era o dia do amor. Não havia lavrador que não tivesse na cidade a sua amante de casa posta. Era um sinal de “status”. Claro que, nos outros dias da semana …

Cada herdade tinha uns largos milhares de hectares e lembro-me de um que possuía 23! Tinham gado, grandes rebanhos de ovelhas e cultivavam principalmente trigo. Se o tempo corria de feição, as searas eram boas e eles mudavam de carro. Se eram más, o Estado subsidiava-os e eles com o subsídio mudavam de carro.
Havia poucos carros na terra: um do veterinário, outro, muito antigo, do médico e mais 4, um de cada lavrador, pois só os mais “evoluídos” de entre eles se davam a esse luxo, não porque os outros não pudessem comprá-los, mas por, sendo mais “tradicionalistas”, preferirem pavonear-se nas suas “charrettes”.
Tinham uma Sociedade Recreativa, a que nós chamávamos a “sociedade dos ricos”, de admissão condicionada, pois não só não eram admitidos os que não possuíam “nome”, como até porque quem não pertencesse à classe, mesmo tendo dinheiro, acabava por sair por não se sentir lá bem. O veterinário e o médico eram tolerados, porque necessitavam deles.
Na Sociedade entretinham-se lendo jornais e revistas, entre elas o “Sinal”, que era propaganda nazi distribuída por um comerciante de fazendas, bem instalado na vida e germanófilo notório, pois isto passa-se por alturas da II Guerra Mundial. Jogavam às cartas, ao king, pois o bridge era demasiado complexo, e bilhar. No campo anexo e vedado jogavam ténis, pois o ping-pong era demasiado reles para eles.

(continua)

terça-feira, dezembro 12

Quando precisarem...

Há pouco tempo, em Lisboa, um homem percebeu que havia pessoas dentro da sua garagem, a roubar.
Ligou para o 112, atendeu a polícia, mas disseram-lhe que não havia ninguém por perto para ajudar, que mandariam alguém assim que possível.
Desligou.

Uns minutos depois, ligou novamente e disse: "Olá, eu liguei há bocado porque estavam pessoas a assaltar a minha garagem. Já não é preciso virem depressa, porque eu matei-os".

Passado pouco tempo, estavam meia dúzia de carros da polícia na área, uma ambulância e uma unidade do INEM. Os ladrões foram apanhados em flagrante.

Então um dos polícias disse:
"Pensei que tivesse dito que os tinha morto!"
Ao que o senhor respondeu:
"Pensei que tinha dito que não havia ninguém disponível."

É assim. Quando precisarem já sabem...

segunda-feira, dezembro 11

BOAS FESTAS







A todos os amigos que nos têm visitado ao longo deste ano e seus familiares, desejamos Festas Felizes e um Natal cheio de alegria e de saúde, fazendo votos para que não se esqueçam dos que não têm essa possibilidade.

(Foto Peter)

domingo, dezembro 10

Mais um passo na compreensão de um fenómeno poderoso

Com o auxílio do telescópio espacial Swift, uma equipa de cientistas observou duas dúzias de explosões de estrelas, designadas por “supernovas”, pouco depois de estas terem ocorrido.

O objectivo principal do telescópio espacial Swift é o estudo das “explosões de raios-gama” (ERG), as explosões mais energéticas de todo o Universo. A maioria das ERG não duram mais do que cerca de 10 segundos, o que torna essencial a rapidez de um instrumento para a detecção e estudo destes fenómenos. Existem vários tipos de “supernovas” que diferem na forma como são originadas e na radiação que emitem. Enquanto que na nossa galáxia uma “supernova” ocorre apenas uma ou duas vezes em cada século, no Universo próximo, este número aumenta para umas dúzias. Estas explosões ocorrem suficientemente perto para serem observadas e estudadas em detalhe utilizando telescópios terrestres e espaciais.

Nestes estudos destacaram-se duas “supernovas”: uma das explosões, designada por SN 2005ke é a primeira “supernova Tipo Ia” a ser detectada no comprimento de onda dos raios-X, e revelou ser muito mais brilhante nos ultravioleta do que se esperava.
As “supernovas Tipo Ia” são designadas por "velas padrão" e os astrónomos utilizam-nas para medir distâncias no Universo, devido ao facto de cada uma destas explosões possuir uma luminosidade conhecida.

Apresentamos um conjunto de 3 imagens (da esquerda para a direita: no óptico, no ultravioleta e nos raios-X) da SN 2005ke.




Existem duas teorias para a origem das “supernovas Tipo Ia”: a explosão de uma “anã branca” que orbita uma outra “anã branca”, ou a explosão de uma “anã branca” em órbita de uma estrela “gigante vermelha”. A “anã branca” é um objecto muito denso e pode "roubar" matéria à sua companheira. Devido à adição de matéria, a “anã branca” acaba por aumentar a sua massa que, ao atingir o nível crítico de 1,4 massas solares, acaba por explodir.

A equipa descobriu evidências directas, na luz ultravioleta e raios-X proveniente da SN 2005ke, de que a “anã branca” (agora desfeita) estava em órbita de uma “gigante vermelha”.

Uma outra “supernova” a destacar-se foi a SN 2006bp. Esta “supernova”, de Tipo II, é originada pelo colapso do núcleo de uma estrela de grande massa quando esta esgota o seu combustível. No caso desta “supernova”, a equipa foi capaz de observar a explosão em detalhe, menos de um dia após esta ter ocorrido, um recorde para qualquer telescópio espacial.
Para ver um conjunto de 3 imagens (da esquerda para a direita: no óptico, no ultravioleta e nos raios-X) da SN 2006bp.



Os raios-X fornecem informações directas acerca da composição química e da vizinhança da estrela que explodiu. Esta radiação é também um indicador da presença, na vizinhança da estrela, de gás muito quente aquecido pela explosão.

(ASTRONOVAS – OAL, adapt.)

sexta-feira, dezembro 8

Aurora boreal


(Auroras over Finland on Dec. 8th. Credit: Vesa Särkelä)

A minha disposição e estado de espírito não são bons. Ontem tive de me deslocar ao Alentejo para ir ao funeral dum companheiro da minha juventude. Uma perda é sempre uma perda e nós estamos na lista de espera. Ninguém sabe quem se segue. Para ele foi o fim dum sofrimento, que corajosamente enfrentava.

Estive em casa da antiga empregada dos meus pais, que nos ajudou a criar os filhos. Queria que eu lá almoçasse, mas eu estava com pressa de regressar a Lisboa. Acompanhou-nos até ao carro e ali estivemos a falar dos nossos problemas, que ela fazia como seus.

Telefonou-me há pouco o filho a dizer que ela morrera. Tinha ido buscar o pão, quando um avc fulminante acabou com ela. Nem queria acreditar. Há menos de 24 horas que estive com ela.

Chorei. Há quantos e quantos anos não o fazia.

Maria Luísa, apesar de não seres da minha família, tu eras a minha família.

Resolvi publicar esta aurora boreal, foto tirada hoje. É uma homenagem. Amanhã lá estarei para te acompanhar, a chorar, não a rir como ontem estivemos junto ao meu carro.

Puta de vida …

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Vem ter comigo...

Deixa essa tua vida de segredo
passa por cima do medo
Vem ter comigo.
Serei o teu abrigo
como porto na tempestade
como força conta a maldade.

Vem ter comigo
porque a noite arrefece cedo
e depois é muito tarde.





Foto: Nuno Ferreira

quinta-feira, dezembro 7

O Rio Douro no passado sábado 25-11-2006


Para não dizerem que só publico fotos de Lisboa, aí têm uma esplêndida foto que me foi enviada por uma amiga portuense e que retrata o Douro durante as grandes cheias de Novembro.
Mas não me chamem “mouro” …

Breves comentários para quem pretende praticar desporto

1) A minha tia aos 80 anos começou a andar 5 km por dia. Hoje tem 97 e ninguém sabe onde ela está.
2) Inscrevi-me num ginásio, no ano passado, e não perdi um quilo sequer... ... Parece que é preciso participar nas actividades...
3) Tenho de fazer exercícios de manhã, antes que meu cérebro perceba o que estou a fazer.
4) Não faço nenhum exercício. Se Deus quisesse que tocássemos os dedos dos pés, Ele tê-los-ia feito mais próximos das mãos.
5) Gosto das longas caminhadas, principalmente quando feitas por pessoas que me aborrecem.
6) Tenho ancas largas, mas felizmente o meu estômago cobre-as.
7) A vantagem de fazer exercícios todos os dias é que morremos com boa saúde.
8) Eu não corro porque entorna o gelo do copo.
9) A tartaruga não faz nada, anda bem devagar e dura 200 anos....
10) Se nadar emagrece, então porque é que a baleia é gorda?

(enviado por pessoa amiga)

quarta-feira, dezembro 6

Fado vadio


O "Fado vadio" define-se como sendo aquele que é cantado em tascas onde a porta está aberta a quem quer fazer da sua voz a expressão do que sente, recebendo por isso apenas o silêncio de quem o escuta e as palmas de quem com ele sente. Acompanhado por uma viola e guitarra cujo trinar tortuoso segue as palavras do fadista, o Fado sai à noite relatando histórias de amor, ciúme, traição, dor e alegria, sentimentos contraditórios de uma vivência urbana, bairrista.

Aqui não será bem "Fado vadio", até porque só há uma viola e os artistas resolveram vir para a rua ganhar uns Euros, nesta época natalícia. Claro que eu aproveitei e com a aquiescência deles, fiz o "boneco".

(Foto Peter)

terça-feira, dezembro 5

Livros


“À noite a biblioteca acende ténues brilhos muito fracos quase invisíveis. Chamas secretas envergonhadas começam a deslizar pelo espaço. Dançam poesias medievais e seiscentistas. Cantam histórias de debaixo do mar e um homem gigante que deu à praia com barbas de conchas e coração de menino, já morto mas tão belo que homens e mulheres o amaram na morte, e que trazia na mão o poema de amor de Gabriel. Tecem e destecem e tecem o eterno véu de Penélope e com Penélope esperam a espera de todas as esperas e com Penélope desdenham o banquete dos pretendentes e com Penélope vêem por fim surgir entre as estantes a chama sempre tardia e jamais recusada de Ulisses regressado da luz envolvente de esquecimento e de desejo de Calipso. Acendem-se cantigas de Manuel Alegre que no rio escrevem com doçura os nomes dos amigos mortos sobre as águas. Acendem-se os desejados verdes ciganos de Lorca e ergue-se, vinda do fundo de uma qualquer mesa de leitura, uma sua lua de prata, depois outra lua de prata e uma terceira lua de prata, quatro, cinco, seis, sete luas de prata! E as luas de prata de Lorca a parir incessantemente mais luas de prata iluminam o riso das dálias em frente às quais, sentados num banco de pedra de um livro de arte sacra, esperam na longa vigília da mentira Dom Quixote e Sancho Pança na amizade incondicional que nunca precisou de verdades. Acendem-se outras chamas e outras luas, eventualmente, acendem-se até o sol por fim nascer e as recolher como doces vampiros às páginas de onde saíram. Outro dia. Outra vez. Até que a noite novamente as acenda. Porque tudo sempre regressa e não existe morte capaz de apagar as chamas infinitas dos filhos das estrelas.”

Foto Peter

domingo, dezembro 3

Baiser dans l’Hotel de Ville (Beijo na Prefeitura)


Esta foto é célebre. Foi tirada por Robert Doisneau, um dos mais importantes fotógrafos franceses do último século e cuja obra pode ser vista na exposição: “Doisneau – Paris em Liberdade”, que se encontra em exibição na prefeitura da capital francesa até 17 de Fevereiro de 2007.
É uma das suas imagens mais famosas, feita em 1950 para a revista norte-americana Life.
Robert Doisneau tornou-se mundialmente conhecido pelas suas imagens que mostravam o lado popular e romântico de Paris. Nascido na periferia da capital francesa, percorreu incansavelmente as ruas de Paris durante 60 anos, fotografando cenas do quotidiano, sobretudo entre as décadas de 40 e 60.

A exposição acima referida reúne 280 fotos, tiradas pelas ruas de Paris entre os anos de 1930 e o início da década de 90 e tem como objectivo realizar um passeio pelo imaginário parisiense do fotógrafo. A sua obra fez com que ele fosse considerado um fotógrafo da chamada "escola humanista", movimento artístico que inspirou cineastas como Marcel Carné ou escritores como Jacques Prévert, mas o fotógrafo sempre recusou a ideia de que o seu trabalho pudesse ser comparado ao de um historiador da capital ou de um etnólogo e dizia ser apenas uma "falsa testemunha da sua época".

As suas fotos permitem observar as grandes mudanças da cidade que se modernizava: da Paris romântica dos anos 50 aos prédios de concreto dos anos 70, Doisneau fotografou as transformações urbanas da capital. Mas Robert Doisneau também foi um dos pioneiros na arte de fotografar personalidades em lugares do quotidiano, como o cineasta Orson Wells ou o escultor Giacometti.

Doisneau vendeu a sua primeira reportagem fotográfica em 1932 e logo depois foi contratado como fotógrafo industrial pela Renault, acabando sendo despedido por faltar com frequência ao trabalho. Na realidade, preferia tirar fotos pelas ruas de Paris. O fotógrafo faleceu em Abril de 1994, deixando um acervo de 450 mil negativos.

(Elementos colhidos no Google, para além da foto já fazer parte dos meus arquivos e conhecer o seu autor)

sábado, dezembro 2

António Ramos Rosa


Venceu o Grande Prémio de Poesia APE/CTT de 2005, com "Génese", de que publico a seguir uma poesia.
António Ramos Rosa, de 82 anos e natural de Faro, é um dos maiores nomes da poesia portuguesa contemporânea.
O poeta fora recentemente distinguido com o Prémio de Poesia Luís Miguel Nava e o Prémio PEN Clube de Poesia, ambos referentes também a 2005.
Distinguido com vários prémios nacionais e estrangeiros, recebeu o Prémio Pessoa em 1988.


QUANDO UMA MULHER SE DESPE

Quando uma mulher se despe numa clareira rodeada de arbustos
e sobre uma toalha se estende ao sol o seu desejo é ambíguo
porque não quer ser vista e ao mesmo tempo a sua pele estremece
sob um olhar ausente ou de alguém escondido entre a folhagem
Também a palavra se expõe e oculta no seu fulgor de lâmpada
alimentada pelo fogo obscuro que aspira à nudez solar
Ela inclina-se sobre a água para ver a sua imagem
com o olhar não dela mas de um outro que a move
para ser a presença pura no olhar de ninguém
e poderá ser um dia o de algum leitor que se deslumbra com a sua abstracta nudez

Sem esta duplicidade e sem este puro recato através do silêncio
ela não possuiria o frémito ideal da sua exposição
e seria opaca ou demasiado transparente sem os meandros cintilantes
que a tornam fugidia como um fio de mercúrio
e a sua nudez teria a consistência inerte
de uma pedra sem fogo e sem sal sem o focinho do desejo
Por isso o poema é uma mulher que se enrola na sua nudez
até ser tão redonda como redondo é o ser
com a sua língua bífida entre os lábios do seu sexo

(António Ramos Rosa, "Génese", Roma Editora, FEV 2005)

sexta-feira, dezembro 1

01 Dezembro 1640

Pai - É feriado porque a 1 de Dezembro de 1640 os nossos antepassados reconquistaram a Independência de Portugal, expulsando para sempre os espanhóis.

Filho - Fixe... E na fuga eles deixaram para trás o Banco Santander, o Corte Inglês, a TVI, a Zara, a Telepiza, a Somague, etc, etc... Foi isso?

(in Correio da Manhã, "quiosque", 01.12.06)

Amadeo de Souza-Cardoso


Nascido em 1887 e falecido prematuramente aos 31 anos de idade vítima de pneumonia, precursor da arte moderna, Amadeo de Souza-Cardozo não teve oportunidade de ver o seu trabalho reconhecido: "seguiu o mesmo trilho dos vanguardistas de todos os tempos e de todas as actividades, administrando a incompreensão alheia. À humanidade custa a aceitar novos processos ou ideias e, por conseguinte, para os precursores, a apreciação objectiva e o coroamento dos seus esforços dá-se ou no final da vida, ou somente após a sua morte."

Lentamente, à medida que os preconceitos em relação ao modernismo foram sendo afastados, o nome de Souza-Cardoso ganhou a devida importância em Portugal. Ninguém é culpado, ele era um visionário, vivia fora do seu tempo e, tal como tantos outros, pagou um alto preço por isso.

No ano das comemorações do cinquentenário da Fundação Calouste Gulbenkian completam-se 100 anos sobre a partida do artista para Paris, com 19 anos, onde tomou contato com o Impressionismo e depois com o Expressionismo e o Cubismo. Ali valeu-lhe muito a sua aproximação com Amadeu Modigliani, de quem se tornou grande amigo, compartilhando com ele um atelier e até realizando exposições juntos, em 1911. Depois de participar numa exposição nos Estados Unidos, em 1913 voltou a Portugal, onde teve a ousadia de realizar duas exposições, respectivamente no Porto e em Lisboa, causando escândalo entre os seus compatriotas e chegando até a haver confrontos físicos entre críticos e defensores da arte moderna. Em 1918, surgiria a grande oportunidade de desenvolver e encontrar reconhecimento da sua obra, mas Souza-Cardoso não teve tempo para esperar. Morreu nesse mesmo ano, como se disse acima, e muito tempo se passou até que as opiniões fossem revistas e o seu nome ocupasse o devido lugar na história da pintura portuguesa.

Como o artista nasceu no dia14 de Novembro, a FGG escolheu simbolicamente essa data para celebrar esse conjunto de acontecimentos. Podem ali apreciar a exposição do artista até 15 JAN 2007.