sexta-feira, fevereiro 27

Deus da pobreza em época de crise

“Num santuário a quatro horas de Tóquio, os peregrinos são convidados a bater numa imagem do mais pobre dos deuses.
A ideia do santuário partiu de Tessen Sakura. Lá dentro encontra-se uma imagem de madeira de um homem magro e sujo, o deus da pobreza, que leva o infortúnio e a desolação económica a todo o lado onde vai.
Os peregrinos chegam em autocarros e munidos de um bastão de madeira, batem com toda a força num pilar localizado em frente à estátua, dando de seguida três pontapés.

Entrevistado pela Reuters, Toshitami Ota afirmou que tinha conseguido libertar-se “do rancor dos últimos 50 ou 60 anos” através da cerimónia. Mas há pelo menos duas pessoas que não se podem queixar dos efeitos da presença deste pobre deus: o casal que fundou o santuário deixou para trás um longo historial de negócios falhados e agora recebe um bom rendimento dos milhares de peregrinos que têm visitado o santuário.” (in “página 1”)

Já estou a ver aí um portuguesito a fazer, não um santuário, mas uma pequena construção, onde colocaria e para o mesmo fim, uma imagem de madeira de um político por demais conhecido…

segunda-feira, fevereiro 23

Domani


"Morre lentamente quem não viaja, quem não lê, quem não ouve música, quem destrói o seu amor-próprio, quem não se deixa ajudar.
Morre lentamente quem se transforma escravo do hábito, repetindo todos os dias o mesmo trajecto, quem não muda as marcas no supermercado, não arrisca vestir uma cor nova, não conversa com quem não conhece.
Morre lentamente quem evita uma paixão, quem prefere o "preto no branco" e os "pontos nos is" a um turbilhão de emoções indomáveis, justamente as que resgatam o brilho nos olhos, sorrisos, corações aos tropeções, sentimentos.
Morre lentamente quem não vira a mesa quando está infeliz no trabalho, quem não arrisca o certo pelo incerto para ir atrás de um sonho, quem não se permite, uma vez na vida, fugir dos conselhos sensatos.
Morre lentamente quem passa os dias queixando-se da má sorte ou da chuva incessante, desistindo de um projecto antes de iniciá-lo, não tentando um assunto que desconhece e não respondendo quando lhe indagam o que sabe.
Evitemos a morte em doses suaves, recordando sempre que estar vivo exige um esforço muito maior do que o simples acto de respirar.
Estejamos vivos, então!" (Pablo Neruda)

Estar vivo é gozar o momento presente. Hoje foi o dia melhor da minha vida, porque estou vivo, porque tenho saúde e porque não vivo mergulhado no passado. Passado é passado.
Fiz coisas tremendamente importantes: tomei banho num mar um bocado agitado, mas que eu gosto, porque gosto de cortar as ondas. Depois fui “trabalhar para o bronze”. Pouco tempo. Levantei-me, comi uma maçã à dentada e fui explorar as rochas distantes, fazer umas fotos. Talvez publique alguma no blog, se me apetecer. Isso sim, isso é que é verdadeiramente importante: «se me apetecer».
À tarde, enquanto esperava que a loja de “take away” abrisse, estive no meu carro ouvindo uma colectânea dos “Beatles”. Música pré-histórica? Será. Mas gosto especialmente do “yesterday” e da “Lucy in the Sky with Diamonds.
Foi bom, não foi?

“Je ne regrette rien”

E amanhã? Será bom se acordar. É a melhor coisa que me poderá acontecer e tudo o que vier será bom.
“Domani è un altro giorno”

(Foto Peter. Estou no Algarve, mas sossegado, não gosto do Carnaval, tenho horror às multidões)

domingo, fevereiro 22



Vim há dias da minha terra
onde encetei a leitura
de uma colectânea
de poemas em
homenagem
ao Porto,

Abre assim


Ao Visitante

Entrego-te as chaves da cidade
A chave da torre que do alto nos abre
O voo das aves e os pórticos do mar
A chave das muralhas do burgo antigo
Que nos abre os mistérios do rio
A chave viva dos arcos da ribeira
Na livre expressão das falas do povo
E chave de cais, senhora zelando
Os tesouros do sol no ouro do vinho


(Luís Veiga Leitão)

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quinta-feira, fevereiro 19

As agruras da oposição

“As últimas sondagens sobre a direita dão o PSD como moribundo e o CDS-PP como ameaçado.
Manuela Ferreira Leite ameaça bater por baixo o resultado eleitoral obtido por Santana Lopes em 2005, enquanto Paulo Portas corre o risco de ver o BE ficar por cima do seu projecto político.

Sem a crise, o Freeport e o inevitável desgaste de quatro anos, Sócrates poderia esfregar as mãos de contente.
Se a democracia portuguesa funcionasse como recomendam os manuais, deveria ser o PSD, e não a fronda “alegrista”-trotskista-comunista, a ameaçar a maioria absoluta do PS.
Pela simples razão de que, em Portugal, as eleições se ganham e perdem à boleia daquelas centenas de milhares de votos ao centro, que ora pendem para o PS ora para o PSD. A questão está então em saber por que razão Ferreira Leite não os consegue cativar.

O ruído dos media e as avaliações personalistas falam dos defeitos da líder do PSD: que fala pouco, que é demasiado sisuda para o circo da política, que é uma excelente técnica mas sem imagem telegénica. Isto é verdade, mas não chega para explicar o quase-coma da oposição socialdemocrata.

Para lá dos supostos defeitos de Ferreira Leite, há que atender ao próprio feitio do sistema partidário português, sobretudo na área do bloco central. O moderno PS, criado em 1973, e o PSD, criado em 1974, surgiram para administrarem e governarem o Estado num momento em que tudo recomeçava do zero. Foram feitos de raiz para o poder e só vivem bem do poder. Num e noutro, a solidez do líder, a fidelidade da máquina e a galvanização dos militantes é directamente proporcional à quantidade e qualidade de recursos, lugares e oportunidades que o “caciquismo burocrático” pode fornecer a clientelas mais ou menos famintas. Num país em que, há séculos, o Estado é o empregador-mor face à fraqueza da sociedade civil, quem faz oposição pode ter sonoras palavras para oferecer ao eleitorado desiludido – mas não tem recursos públicos para distribuir. Foi esse o drama de Constâncio e Sampaio perante Cavaco; o de Nogueira e Marcelo perante Guterres; e é o de Ferreira Leite perante Sócrates.

Enganam-se porém todos os socialistas que regozijam com as agruras do PSD. O mal-estar da oposição - de qualquer oposição – é um problema de democracia. É que quem não tem concorrência no mercado tende a desleixar o produto que vende; e no caso da política, o produto é o bem-estar comum, e o cliente somos todos nós.”

(José Miguel Sardica - Professor da Universidade Católica Portuguesa – in “página 1”)

terça-feira, fevereiro 17

Partir a cabeça...

Palavras para quê?


E o homem tem um blogue para visitar.


http://www.beppegrillo.it/english.php

segunda-feira, fevereiro 16

Balão da NASA capta mistério cósmico no rádio


Escutar o princípio do Universo acaba de se tornar mais complicado. Uma equipa liderada por Alan Kigut do Centro Aeroespacial Goddard da NASA em Greenbelt, Maryland, anunciou a descoberta de um ruído cósmico no rádio com um volume seis vezes maior do que o esperado.
A descoberta vem de um instrumento chamado ARCADE (Absolute Radiometer for Cosmology, Astrophysics, and Diffuse Emission) a bordo de um balão. Em Julho de 2006, o instrumento foi lançado a partir do Complexo de Balões Científicos Columbia da NASA em Palestina, Texas, e voou até uma altitude de quase 37 mil metros, onde a atmosfera se dilui com o vácuo do espaço.
A missão ARCADE tinha o objectivo de pesquisar o céu em busca do calor da primeira geração de estrelas. Ao invés, descobriu um puzzle cósmico.
"O Universo realmente surpreendeu-nos," diz Kogut. "Em vez dos ténues sinais que esperávamos encontrar, aqui estava este alto ruído seis vezes maior do que tínhamos previsto." A análise detalhada excluiu uma origem de estrelas primordiais ou de fontes de rádio conhecidas, incluindo gás no halo exterior da nossa Galáxia. A fonte deste barulho de fundo cósmico no rádio permanece um mistério.

Muitos objectos no Universo emitem ondas de rádio. Em 1931, o físico americano Karl Jansky detectou pela primeira vez estática da nossa própria Via Láctea. Emissões semelhantes de outras galáxias criam um ruído de fundo no rádio.
O problema, realça o membro da equipa Dale Fixsen da Universidade de Maryland em College Park, é que parecem não existir galáxias-rádio suficientes para explicar o sinal que o ARCADE detectou. "Teríamos que as agrupar no Universo como sardinhas," disse. "Não sobraria espaço entre uma galáxia e a outra."

O muito procurado sinal das primeiras estrelas permanece escondido por trás deste recém-detectado ruído de rádio. Complica os esforços para detectar as primeiras estrelas, que se pensa terem sido formadas há 13 mil milhões de anos atrás -- não muito, em termos cósmicos, depois do Big Bang. Mesmo assim, estes ruídos radiofónicos cósmicos poderão proporcionar pistas importantes acerca do desenvolvimento das galáxias quando o Universo tinha menos de metade da idade actual. Desvendar as suas origens deverá providenciar novas informações acerca do desenvolvimento das fontes de rádio no começo do Universo.

O ARCADE é o primeiro instrumento a medir o céu no rádio com precisão suficiente para detectar este misterioso sinal. Para aumentar a sensibilidade dos receptores de rádio do ARCADE, foram imersos em mais de 1800 litros de hélio líquido ultra-frio. A temperatura operacional do instrumento situava-se apenas 2,7 graus acima do zero absoluto.
Esta é a mesma temperatura que a radiação cósmica de fundo em microondas, o calor remanescente do Big Bang que foi descoberto como uma fonte de ruído cósmico no rádio em 1965. "Se o ARCADE tem a mesma temperatura que a radiação cósmica de fundo, então o calor do instrumento não pode contaminar o sinal cósmico," explica Kogut.

domingo, fevereiro 15



«Pela primeira vez, há muito tempo,
pensei na minha mãe.

Julguei ter compreendido porque é que,
no fim de uma vida, arranjara um “noivo”,
porque é que fingira recomeçar.

Também lá, em redor desse asilo
onde as vidas se apagavam, a noite
era como uma treva melancólica.

Tão perto da morte, a minha mãe
deve ter-se sentido libertada
e pronta a tudo reviver.


Como se esta grande cólera me tivesse limpo
do mal, esvaziado da esperança, diante
desta noite carregada de sinais
e de estrelas, eu abria-me
pela primeira vez
à terna indiferença do Mundo

(Albert Camus, O estrangeiro)

Um texto mágico,
a que costumo associar este outro:


«Em que meditas, meu amigo?
Será nos teus antepassados?
Todos eles são pó no pó.
Meditas nas virtudes deles?
Repara só como sorrio.
Toma desta copa e bebamos,
Ouvindo sem inquietação
O grande silêncio do mundo


Omar Khayyam, Rubaiyat

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sábado, fevereiro 14

Um copo de água com sabor a desejo

Depois da minha visita aos livros da FNAC, onde sinto o prazer quase sensual de lhe mexer, de os folhear, de sentir o seu cheiro e com passagem obrigatória pelos CDs e DVDs, normalmente mais para ver que comprar, subo ao 2º andar onde vou beber um bom café, pois locais não faltam por lá. Claro que não vou dizer o nome do estabelecimento, até porque não quero ser acusado de estar a fazer publicidade, mas quem é frequentador assíduo do local sabe bem a qual me refiro.

Costumo ficar sentado numa mesa no recanto duma janela, pois tem a dupla vantagem de ver a rua e o interior do café. Gosto de observar as pessoas que entram e saem, que se sentam e por ali ficam e de ficar conjecturando sobre elas, tecendo histórias.

Um casal que entrou chamou-me a atenção: ele mais alto que ela, eram novos, mas não jovens. Deviam ser frequentadores habituais e, por isso, sabiam para onde se dirigir, pois manifestaram um ar de desagrado quando viram o local ocupado e tiveram que se sentar nas proximidades.
Mantendo uma certa discrição (contenção?) tinham todo o ar de se tratar dum casal apaixonado e como Cupido, ou Eros, ou os dois, têm prazer em proteger os enamorados, a tal mesa de canto vagou e eles distanciaram-se um pouco do meu campo de visão, mas não o suficiente que não me impedisse de os continuar a observar.
Ele mais ousado, prodigalizava-lhe atenções, enquanto ela aparentava mais recato, o que não impedia que o continuasse a devorar com os olhos.

Ela bebeu uma bica, a especial da casa, sem açúcar e muito curta. Ele optou por uma água mineral fresca e sem gás.

Por ali continuaram conversando numa doce intimidade. Ela bebeu o café e começou beberricando a água do copo dele, marcas de baton, sobrepondo-se a marcas de lábios no vidro do copo: um copo de água com sabor a desejo.

Levantaram-se e ele pegou-lhe na mão e partiram, possivelmente para se amarem perdidamente, afinal é dia de S.Valentim.

sexta-feira, fevereiro 13

Compras com cartão


Durante a semana passada, Timothy Geithner, o novo Secretário do Tesouro, fortaleceu a confiança dos investidores ao afirmar que o Estado norte-americano irá promover todos os esforços para combater a recessão. Destaque ainda para o anúncio de Obama de que as empresas que, no futuro, recorrerem ao apoio estatal, terão que limitar o rendimento dos executivos de topo em $500.000 por ano. Corresponde, considerando 14 meses, a 26.242€/mês, ou seja 5.261.192$00/mês.
De acordo com o seu comunicado, as compensações adicionais deverão assumir a forma de acções, cuja liquidação só poderá ocorrer depois da empresa saldar a sua dívida ao Estado.

Pobres americanos…

Gostei de ouvir Francisco Louçã a ser entrevistado por Judite de Sousa.
Convincente.

quinta-feira, fevereiro 12

Aos amores...

Honestamente não me apetece escrever.
Não é que não goste, porque gosto e muito.
Mas ao notar o enorme leque de assuntos interessantes para colocar à discussão, até fico bloqueado.
Por isso é que vou lançar para a mesa o debate sobre um caso absolutamente banal.
Ou talvez não.


Dois jovens, namorados, portanto um casal, joga frequentemente ao euromilhões. A sorte bateu e ganharam os tais milhões.

Alegria. Ou talvez não.

Depois de um depósito em nome de ambos e dos pais da rapariga – sabe-se lá porquê os pais também –, dá-se a bronca.
Diz o Correio da Manhã que “A cisão deu-se quando Luís, a residir em Courel, pretendia dinheiro da sua parte para presentear pais e irmãos. Terá sido o pai de Cristina, de Remelhe, a negar o pedido, remetendo-o para depois do casamento.”
O rapaz quer metade a rapariga quer tudo, aparentemente encorajada pelos seus parentes. Argumento: em vez de jogar as habituais chaves, apostou mais 2 euros e jogou mais uma chave, a tal que deu os milhões.

Tudo estragado. De repente os 15 milhões não chegam para dividir por duas famílias que, aparentemente, não era assim tão abastadas.
Os amigos e vizinhos estão estupefactos.

E assim vai o amor e a paixão.

A base que pode ser decisiva para a manutenção de uma relação: o desafogo económico, acabou por destruir - ou quiçá provar a sua fragilidade-, este amor e carinho de dois jovens idiotas.
Ao menos que se divertissem, cada um com a sua parte.

E assim vai a vida. Assim se percorrem estes dias, um dia de cada vez, à espera de sermos abalroados, se ainda ao não fomos, por pessoas pouco honestas, pouco sensíveis e responsáveis pela forma como os nossos descendentes se irão ter de comportar um dia.

Sim, porque não adianta nada que alguns miúdos tenham valores elevados. Um dia serão comidos pela avidez de outros que são para isso instruídos.

Pouco optimista?
Já alguma vez vos cuspiram na cara?
Não?
É um sapo enorme e difícil de engolir…


(Vídeo: d'age ao vivo em Almada - L'amour)

terça-feira, fevereiro 10



"Os donos do capital vão estimular a classe trabalhadora
a comprar bens caros, casas e tecnologia,
fazendo-os dever cada vez mais,
até que se torne insuportável.

O débito não pago levará os bancos à falência,
que terão que ser nacionalizados pelo Estado"


Karl Marx, in Das Kapital, ano de 1867

[correio em circulação na rede]

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segunda-feira, fevereiro 9

Utopias

Francisco Louçã apresentou as propostas do Bloco de Esquerda para "responder agora à crise em nome de quem precisa": um serviço público bancário que garanta juros e taxas não especulativas, a proibição de entrega de dividendos aos accionistas por parte de empresas que tenham recebido benefícios do Estado, a proibição dos despedimentos nas empresas com lucros, o aumento das pensões e do salário mínimo (para chegar a 600 euros em dois anos), a revogação do código do trabalho e o imposto sobre as grandes fortunas.

Utopia?

Sócrates, na reunião do PS no Porto disse que pretendia limitar as deduções fiscais dos mais ricos para poder aliviar a carga fiscal da classe média.
Utopia, pois contam-se pelos dedos de uma mão as pessoas que apresentam declarações fiscais com rendimentos escandalosamente altos e o que vai acontecer é que qualquer família da classe média (os remanescentes…) de trabalhadores por conta de outrem, corre o risco de nas estatísticas do IRS se enquadrar entre os ricos.

«Os contribuintes por conta de outrem serão sempre os principais mecenas do Fisco.»

domingo, fevereiro 8

O Doutor Ferreira do Amaral, — não o engenheiro da Brisa, mas um, presumo que, seu irmão —, previu ontem na Sic, no programa “O Expresso da Meia-Noite” a necessidade de duas medidas de política económica que, executadas, mudarão radicalmente o modus vivendi das sociedades nos próximos anos.

Primeira. Cumprir a contenção de endividamento externo dos estados da União Europeia forçará alguma cooperação entre os estados da União. Ora, como já não há moedas nacionais — excepto a Inglaterra e alguns membros do Leste; os quais aproveitam o facto para desvalorizar as suas moedas, assim embaretecendo as exportações, encarecendo as importações e, desse modo, facilitando a contenção do endividamento por reequilíbrio das respectivas balanças de pagamento — a União vai ter de aprovar um mecanismo tributário que subsidie as exportações e tribute as importações dos estados membros excessivamente endividados. Ou seja, vai ter de permitir o uso de alguns mecanismos de reequilíbrio que anteriormente eram proporcionados pela soberania monetária de que os países abdicaram.

Segunda. Para evitar que a economia derrape da recessão para a depressão — esta, uma fase de estagnação, de desemprego elevado, sub-utilização da capacidade de produção instalada, produtiva com uma e atonia prolongada de negócios, de três a cinco anos —, os países vão ter estimular muito mais o consumo e o investimento, a reanimar as expectativas e perspectivas de confiança no futuro. Esse estímulo é impossível com a poupança que existe, pelo que os estados da União terão de recorrer ao financiamento monetário, i.e., à emissão de papel moeda, ou seja euros impressos nas Casas de Moeda para entregar ao Banco Central Europeu em quitação dos empréstimos contraídos! Ou seja, como não é permitido na União Europeia saldar défices de estado com emissão de moeda, mas como tal medida é imprescindível para evitar a depressão económica — e a deflação, que seria o grau extremo de crise — Bruxelas vai ter de autorizá-la ficando por saber quem irá liderar o processo.

A desenrolar-se este desenvolvimento, os europeus e os portugueses podem contar com uma ulterior inflação forte que há-de corroer o poder de compra dos salários, das pensões, dos subsídios sociais, rendas de senhorios e juros de empréstimos concedidos.

Ao contrário do que se propala, o desafogo dos empregados e funcionários públicos, e a desgraça das perdas de bolsa dos accionistas ‘falidos’, vai ser sol, e mal, de pouca dura para o desafogo dos primeiros, e para a desgraça dos segundos. Certo será o prejuízo dos dependentes de pensões, subsídios, rendas e juros. Mas, enfim, isso é o costume!

O factor que suscita mais suspense neste momento político é o de ver como a Alemanha vai reagir a isto! Sabe-se que os alemães só aderiram ao Euro para granjear a confiança da França e do Ocidente de que não enfeudariam ao marco os países do Leste Europeu, seu hinterland natural. A reticência alemã derivava sobretudo da experiência catastrófica de hiper-inflação que sofreu na década de 20 do século 20. A célere integração da ex-República Democrática Alemã na República Federal, e por arrasto na União Europeia, foi um bónus de que beneficiou e cujos custos foram em parte suportados pelos demais estados da União.

Veremos como será. Mas duvido muito que os alemães aceitem a liderança da dupla voluntarista Sarkozy-Barroso para conduzir o processo técnico e político de reformulação do modus vivendi económico e monetário. Penso mesmo que, a ser essa a linha vencedora, a Alemanha prefira sair do Euro e regressar ao Marco! Veremos como será.

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sábado, fevereiro 7

O Holocausto e o Vaticano

O Papa Pio XII exerceu o seu pontificado desde 1939 até à sua morte em 1958. O seu silêncio público perante o extermínio dos judeus europeus, apesar dos repetidos pedidos dos aliados para que falasse, é um facto histórico. Os defensores de Pio XII, incluindo o próprio Vaticano, retratam-no como um amigo dos judeus, cuja diplomacia silenciosa e incansável salvou a vida a centenas de milhares de judeus.
Mais difícil de explicar será o auxílio dado pelos funcionários da Igreja a Adolf Eichmann, que acabou por fugir para a Argentina e a outros proeminentes assassinos nazis após a derrota do Terceiro Reich.
Em Novembro de 1999, o arcebispo Weakland fez na Congregação Shalom em Fox Point, Wisconsim, a seguinte e notável afirmação:
«Eu reconheço que nós, Católicos – ao pregarmos a doutrina de que o povo judeu foi infiel, hipócrita e assassino de Deus (…) contribuímos para as atitudes que tornaram o Holocausto possível.»

No Concílio Vaticano II, que decorreu entre 1962-65, Marcel Lefebvre, um dos bispos presentes, declarou-se contra muitas posições de Roma e decidiu fundar uma igreja autónoma, a Fraternidade de São Pio X, que reclama o regresso à missa em latim e recusa o ecumenismo e o diálogo inter-religioso Os seus seguidores instalaram-se na Suíça, onde construíram um seminário e o movimento expandiu-se também por França e Inglaterra. O encontro de Assis que ocorreu em 1986, para o qual o Papa Paulo VI convocou os líderes de outras religiões (e que João Paulo II repetiu após o 11 de Setembro), foi outro momento de discordância que levou Lefebvre a acusar o Papa de se afastar da tradição católica, pondo, assim, em causa a sua autoridade como Chefe da Igreja.
A excomunhão da Igreja Católica deu-se automaticamente, quando Michel Lefebvre ordenou um bispo da sua igreja, acto que é matéria de afastamento automático e sinal de ruptura com Roma.

Em Agosto de 2005 o Papa Bento XVI encontrou-se com o líder da Fraternidade de São Pio X, monsenhor Bernard Fellay, na sua residência de Verão, em Castelgandolfo. O encontro concretiza um passo no caminho para que o movimento seja reintegrado na Igreja, mas é preciso que este queira voltar e esteja disposto a aceitar as regras do Vaticano, pois a ruptura partiu de Lefebvre e não de Roma. Este passo é positivo, pois se há abertura e diálogo com protestantes e ortodoxos, também se compreende que haja com um grupo que rompeu com a Igreja Católica.

Na sequência deste procedimento, o Papa Bento XVI reabilitou quatro bispos excomungados, um dos quais, o britânico Richard Williams, nega que 6 milhões de judeus tenham sido assassinados pela Alemanha nazi, reduzindo esse número para umas centenas de milhar e nega categoricamente a existência de câmaras de gás.

Filha de um pastor protestante, Ângela Merkel explicou o porquê de comentar assuntos da Igreja Católica: "Penso que se trata de uma questão fundamental, que é saber se, graças a uma decisão do Vaticano, alastra a sensação de que o Holocausto pode ser negado." Por isso exigiu ao Papa "que torne claro que não pode ser assim e que deve haver relações positivas com o judaísmo". Na semana passada o Conselho Central Judaico alemão cortou relações com a Igreja Católica, e a polémica alastra na própria Igreja.
O cardeal Walter Kasper, responsável pelas relações com os judeus, criticou Bento XVI por não o ter alertado para o perdão aos bispos excomungados. Antes dele, o bispo de Hamburgo, Werner Thissen, considerou que a decisão do Vaticano compromete a confiança na Igreja, e o cardeal Karl Lehman, antigo presidente da Conferência Episcopal alemã, considera o caso uma catástrofe.
Em resposta, o Vaticano veio declarar que desconhecia a posição do bispo Richard Willians e que este deveria pedir desculpa e retratar-se.

sexta-feira, fevereiro 6

Tântalo: O ouro cinzento

O coltan é um minério nobre composto por dois elementos distintos: colômbio e tantalite. Deste último obtém-se o tântalo, um excelente condutor de electricidade, maleável e extremamente resistente à corrosão, muito utilizado no fabrico de componentes electrónicos, sobretudo condensadores.
Encontramo-lo hoje em artigos correntes (telemóveis, câmaras de vídeo, computadores, play stations, etc.) ou em engenhos altamente sofisticados (mísseis, motores de avião, satélites). Uma dezena de telemóveis necessita apenas de 1,8 gramas do produto. De 3,33 quilos de coltan refinado obtém-se aproximadamente um quilograma de tântalo.
Segundo os entendidos, o coltan da região do Kivu (RD Congo) é o que possui tântalo em mais elevado grau o que pode contribuir para explicar as recentes incursões das tropas ruandesas e longos anos de conflito armado.
Nos circuitos económicos, o comércio do coltan foi classificado como o «nervo da guerra» no Leste do Congo. Intrigas complicadas, que fizeram com que numerosas ONG viessem alertar a opinião pública com este sugestivo slogan: «Nem mais uma gota de sangue no meu telemóvel!»

Também não podemos esquecer que o coltan é um minério radioactivo, com «pequenas» doses de urânio. Embora se ignore ainda o perigo que representam as radiações provenientes do pó radioactivo absorvido durante a refinação do coltan, já se sabe que os resíduos das lavagens são altamente radioactivos, e que estão a poluir grandemente os cursos de água.
Embora presentemente o preço do coltan tenha baixado, continua a ser altamente lucrativo. É duas ou três vezes mais rentável que o ouro e sobretudo infinitamente mais que a agricultura. Um garimpeiro de coltan pode ganhar até 115 dólares em duas semanas, quantia igual à obtida por um agricultor a trabalhar durante um ano inteiro nos campos de feijão na região dos Grandes Lagos.



A gravura mostra-nos crianças a trabalharem na sua extracção: recebem 1 dólar por cada jornada diária de 14h e é normal morrerem duas a três por semana nesse duro trabalho.

(Adaptação do Google)

quarta-feira, fevereiro 4



Um correio electrónico
que dá que pensar:

Noruega... para pensar

'Na Noruega, o horário de trabalho começa cedo (às 8 horas) e acaba cedo (às 15.30). As mães e os pais noruegueses têm uma parte significativa dos seus dias para serem pais, para proporcionar aos filhos algo mais do que um serão de televisão ou videojogos. Têm um ano de licença de maternidade e nunca ouviram falar de despedimentos por gravidez.'

'A riqueza que produzem nos seus trabalhos garante-lhes o maior nível salarial da Europa. Que é também, desculpem-me os menos sensíveis ao argumento, o mais igualitário. Todos descontam um IRS limpo e transparente que não é depois desbaratado em rotundas e estatuária kitsh, nem em auto-estradas (só têm 200 quilómetros dessas «alavancas de progresso»), nem em Expos e Euros.'

'É tempo de os empresários portugueses constatarem que, na Noruega, a fuga ao fisco não é uma «vantagem competitiva». Ali, o cruzamento de dados «devassa» as contas bancárias, as apólices de seguros, as propriedades móveis e imóveis e as «ofertas» de património a familiares que, em Portugal, país de gentes inventivas, garantem anonimato aos crimes e «confundem» os poucos olhos que se dedicam ao combate à fraude económica.'

'Mais do que os costumeiros «bons negócios», deviam os empresários portugueses pôr os olhos naquilo que a Noruega tem para nos ensinar. E, já agora, os políticos.


Numa crónica inspirada, o correspondente da TSF naquele país, afiança que os ministros não se medem pelas gravatas, nem pela alta cilindrada das suas frotas. Pelo contrário, andam de metro, e não se ofendem quando os tratam por tu. Aqui, cada ministério faz uso de dezenas de carros topo de gama, com vidros fumados para não dar lastro às ideias de transparência dos cidadãos. Os ministros portugueses fazem-se preceder de batedores motorizados, poluem o ambiente, dão maus exemplos e gastam a rodos o dinheiro que escasseia para assuntos verdadeiramente importantes.'

'Mais: os noruegueses sabem que não se «projecta o nome do país» com despesismos faraónicos, basta ser-se sensato e fazer da gestão das contas públicas um exercício de ética e responsabilidade. Arafat e Rabin assinaram um tratado de paz em Oslo. E, que se saiba, não foi preciso desbaratarem milhões de contos para que o nome da capital norueguesa corresse mundo por uma boa causa.'

'Até os clubes de futebol noruegueses, que pedem meças aos seus congéneres lusos em competições internacionais, nunca precisaram de pagar aos seus jogadores 400 salários mínimos por mês para que estes joguem à bola.


Nas gélidas terras dos vikings conheci empresários portugueses que ali montaram negócios florescentes. Um deles, isolado numa ilha acima do círculo polar Árctico, deixava elogios rasgados à «social-democracia nórdica». Ao tempo para viver e à segurança social.'


'Ali, naquele país, também há patos-bravos. Mas para os vermos precisamos de apontar binóculos para o céu. Não andam de jipe e óculos escuros. Não clamam por messias nem por prebendas. Não se queixam do «excessivo peso do Estado», para depois exigirem isenções e subsídios.'

É tempo de aprendermos que os bárbaros somos nós.
Seria meio caminho andado para nos civilizarmos.

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domingo, fevereiro 1



«Chamar-me-ia um cobarde e uma nulidade,
se tivesse de te ceder naquilo que me ordenas.

A outros dá as tuas ordens, mas não penses mandar
em mim. Pois penso nunca mais te obedecer.»

Ilíada, I. 293-96

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