domingo, fevereiro 15



«Pela primeira vez, há muito tempo,
pensei na minha mãe.

Julguei ter compreendido porque é que,
no fim de uma vida, arranjara um “noivo”,
porque é que fingira recomeçar.

Também lá, em redor desse asilo
onde as vidas se apagavam, a noite
era como uma treva melancólica.

Tão perto da morte, a minha mãe
deve ter-se sentido libertada
e pronta a tudo reviver.


Como se esta grande cólera me tivesse limpo
do mal, esvaziado da esperança, diante
desta noite carregada de sinais
e de estrelas, eu abria-me
pela primeira vez
à terna indiferença do Mundo

(Albert Camus, O estrangeiro)

Um texto mágico,
a que costumo associar este outro:


«Em que meditas, meu amigo?
Será nos teus antepassados?
Todos eles são pó no pó.
Meditas nas virtudes deles?
Repara só como sorrio.
Toma desta copa e bebamos,
Ouvindo sem inquietação
O grande silêncio do mundo


Omar Khayyam, Rubaiyat

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3 Comentários:

Às 15 fevereiro, 2009 09:03 , Anonymous Anónimo disse...

"...à terna indiferença do mundo."

"...ouvindo sem inquietação o grande silêncio do mundo."

Quando se alcança esta verdade, esta certeza, o mundo começa a ficar para trás e o caminho a seguir terá de ser percorrido a sós.
Não me parece que seja um percurso de inquetude e solidão, pelo contrário, deve ser uma estrada de luz e paz em que vamos cheios, plenos de nós.

Bom Dia

 
Às 15 fevereiro, 2009 19:47 , Blogger escarlate.due disse...

qualquer dos dois está lindo! dificil é ser capaz de lá chegar...

 
Às 16 fevereiro, 2009 23:50 , Blogger Peter disse...

vbm

Interessante a associação do texto do Camus com os versos do Omar Khayyam.
Quanto ao primeiro, tenho citado muitas vezes "a terna indiferença do mundo".
Quanto ao segundo, começo a ver o meu círculo familiar e social a estreitar-se cada vez mais, até que chegue a minha vez.

Mas vem aí o Carnaval e podemos exibir as nossas máscaras de todos os dias, máscaras tristes dum povo que já não acredita em ninguém e pior ainda:

DEIXOU DE ACREDITAR EM SI PRÓPRIO!

 

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