quinta-feira, fevereiro 19

As agruras da oposição

“As últimas sondagens sobre a direita dão o PSD como moribundo e o CDS-PP como ameaçado.
Manuela Ferreira Leite ameaça bater por baixo o resultado eleitoral obtido por Santana Lopes em 2005, enquanto Paulo Portas corre o risco de ver o BE ficar por cima do seu projecto político.

Sem a crise, o Freeport e o inevitável desgaste de quatro anos, Sócrates poderia esfregar as mãos de contente.
Se a democracia portuguesa funcionasse como recomendam os manuais, deveria ser o PSD, e não a fronda “alegrista”-trotskista-comunista, a ameaçar a maioria absoluta do PS.
Pela simples razão de que, em Portugal, as eleições se ganham e perdem à boleia daquelas centenas de milhares de votos ao centro, que ora pendem para o PS ora para o PSD. A questão está então em saber por que razão Ferreira Leite não os consegue cativar.

O ruído dos media e as avaliações personalistas falam dos defeitos da líder do PSD: que fala pouco, que é demasiado sisuda para o circo da política, que é uma excelente técnica mas sem imagem telegénica. Isto é verdade, mas não chega para explicar o quase-coma da oposição socialdemocrata.

Para lá dos supostos defeitos de Ferreira Leite, há que atender ao próprio feitio do sistema partidário português, sobretudo na área do bloco central. O moderno PS, criado em 1973, e o PSD, criado em 1974, surgiram para administrarem e governarem o Estado num momento em que tudo recomeçava do zero. Foram feitos de raiz para o poder e só vivem bem do poder. Num e noutro, a solidez do líder, a fidelidade da máquina e a galvanização dos militantes é directamente proporcional à quantidade e qualidade de recursos, lugares e oportunidades que o “caciquismo burocrático” pode fornecer a clientelas mais ou menos famintas. Num país em que, há séculos, o Estado é o empregador-mor face à fraqueza da sociedade civil, quem faz oposição pode ter sonoras palavras para oferecer ao eleitorado desiludido – mas não tem recursos públicos para distribuir. Foi esse o drama de Constâncio e Sampaio perante Cavaco; o de Nogueira e Marcelo perante Guterres; e é o de Ferreira Leite perante Sócrates.

Enganam-se porém todos os socialistas que regozijam com as agruras do PSD. O mal-estar da oposição - de qualquer oposição – é um problema de democracia. É que quem não tem concorrência no mercado tende a desleixar o produto que vende; e no caso da política, o produto é o bem-estar comum, e o cliente somos todos nós.”

(José Miguel Sardica - Professor da Universidade Católica Portuguesa – in “página 1”)

19 Comentários:

Às 19 fevereiro, 2009 08:50 , Blogger vbm disse...

O marxismo manda observar que classe social é a obreira do real desenvolvimento de uma sociedade. Ora, em Portugal a elite dos trabalhadores intelectuais migra para o estrangeiro e o núcleo esforçado dos trabalhadores manuais migrou para a Europa; já a classe estrita dos empreendedores económicos desatou agora a migrar para Angola. Assim, por cá, a decadência é extrema, não vislumbro quem pode determinar um curso independente para o futuro do nosso país

 
Às 19 fevereiro, 2009 10:07 , Blogger Peter disse...

Tens toda a razão. Também não vislumbro e confesso que não sei o que irei fazer quando for votar para as legislativas. Tempo perdido.

 
Às 19 fevereiro, 2009 11:14 , Blogger antonio ganhão disse...

O Freeport é um caso de estado e que resulta do esquema instalado do financiamento dos partidos políticos. Não mexe. Ninguém mexe.

Agora sugiro que penses em votar desta vez nos porcos, feios e maus, que de metrosexuais já estamos servidos.

 
Às 19 fevereiro, 2009 12:30 , Blogger vbm disse...

Realmente, precipitada a questão sobre em quem votar, também pela primeira vez estou indeciso... A direita não me convence, a esquerda não tem mérito. Talvez justo seja votar em branco. Verei, até lá. Mas não compactuarei com nenhum movimento fascista disfarçado que apareça, que muito receio, nestes tempos de descrédito dos políticos.

 
Às 19 fevereiro, 2009 18:08 , Blogger Manuel Veiga disse...

pois é - a realidade não cabe nos manuais!...

por mto que doa a alguns universitários...

e a política é um pouco mais que a "concorrência no mercado" eleitoral(presume-se)

abraços

abraços

 
Às 19 fevereiro, 2009 23:02 , Blogger SILÊNCIO CULPADO disse...

Peter
Sempre desconfiei que José Sócrates tem ajudado a escolher os líderes do PSD que são sua oposição.
É que só pode.
Abraço

 
Às 20 fevereiro, 2009 09:11 , Blogger Peter disse...

heretico

Vejo autarcas a serem julgados e outros a irem a julgamento. Vejo ainda como são poupados, conseguindo amealhar fortunas durante os seus mandatos.
O enriquecimento sem justa causa não é considerado ilegal.

Então é nesta gente que vou votar?

 
Às 20 fevereiro, 2009 09:16 , Blogger Peter disse...

Silêncio culpado

Olha, se não é parece. Era para ir ver o Magalhães a Torres, mas já não há.

Bom Carnaval, embora "isto" seja um Carnaval permanente.

 
Às 20 fevereiro, 2009 09:56 , Blogger vbm disse...

Ontem, não compreendi, de imediato, o meio sorriso sarcástico do ex-administrador da SLN, nomeado por Cadilhe, e ouvido no Parlamento, quando qualificou de «falta grave» a inspecção do Banco de Portugal (BdP) ter estado meses no BPN sem descobrir nada, quando o auditor Marsans, chamado por Cadilhe, descobriu essas fraudes em meia-dúzia de horas! Interpreto-o, em 'second thought', como eufemística ou velada acusação de os inspectores do BdP estarem corrompidos pelo próprio presumido inocente, Oliveira e Costa, ex-presidente do BPN. Mas claro, posso estar enganado, e o tal meio sorriso ter sido só irónico face à incompetência atroz dos infelizes inspectores.
...

 
Às 20 fevereiro, 2009 10:11 , Blogger Peter disse...

vbm

Será que no nosso (ainda é nosso?) País as pessoas que desempenham funções de responsabilidade e por isso são "regiamente" pagas, não são responsáveis por tudo o que se faz, ou deixa de fazer, nos departamentos, ou instituições a seu cargo?

Na tropa é assim, desde os tempos do Conde de Lippe que reorganizou o Exercito Português:
«O comandante é sempre responsável por tudo o que se faz ou deixa de fazer»

 
Às 20 fevereiro, 2009 10:47 , Anonymous Anónimo disse...

Peter, meu caro, a responsabilidade dos chefes devia suceder em qualquer lado e não apenas na corporação castrense!

Tenho essa visão das coisas, mas deve ser defeito meu.
Pessoalmente, não veria mal nenhum em que o sistema tivesse dois partidos com vocação quase exclusiva de Poder, como é, de facto, o caso do PS e do PSD, conquanto existissem traves mestras da governação que fossem intocáveis.

Digamos que a Educação, a Saúde e a Justiça era desiderato absoluto e obrigatório; e que dentro de cada uma, se estabelecia um conjunto de prioridades nacionais ... ficaria, depois, ao encargo de cada Governo definir a forma como se prosseguiriam as políticas que dessem corpo a esse desiderato.

Penso, mas sem aquela certeza absoluta, que na Confederação Helvética a Constituição impõe um défice concreto.
Não digo que se enveredasse por essa via, mas ao menos que se soubesse que iriam existir áreas onde fosse o PSD, fosse o PS grossa parte dos recursos nacionais iriam aí ser aplicados.

Obviamente que, no meio disto tudo, teríamos de ter pessoas com visão de Estado à frente dos destinos da Nação (e não temos), teríamos de encontrar um "louco" para Primeiro-Ministro que fosse capaz de dinamitar os interesses corporativos instalados de ponta a ponta ... e por aqui me quedo.

 
Às 21 fevereiro, 2009 00:01 , Blogger Peter disse...

Ferrera-Pinto

A minha resposta foi ao comentário do vbm. A responsabilidade dos chefes TEM de suceder em qualquer lado e não sucede.

Obviamente que temos de ter pessoas com visão de Estado à frente dos destinos da Nação, para isso é que há eleições. Continuamos no corporativismo de antes de 1974 ou estamos em Democracia? Não podemos exprimir o nosso descontentamento em relação à vida que levamos? Não culpem a "crise" por tudo o que de mau se passa no nosso país.

 
Às 21 fevereiro, 2009 13:55 , Blogger vbm disse...

A "perfeição" do corporativismo atingiu-se depois do 25 de Abril, pois cada classe profissional e sector de produção 'conquistou' os seus direitos próprios, diferenciados corporação a corporação, assim dando forma substantiva à desigualdade dos cidadãos perante a lei.

Governar acima dos interesses particulares e sectoriais será porventura utópico, mas no mínimo, acerte-se num modelo que privilegie a classe mais promissora do maior desenvolvimento pessoal, social e civilizacional.

 
Às 21 fevereiro, 2009 16:23 , Blogger Peter disse...

vbm

Desigualdade dos cidadãos perante a lei?

Retiremos então as estátuas da Justiça das fachadas de todos os tribunais. É só "fachada".

"Governar acima dos interesses particulares e sectoriais será porventura utópico, mas no mínimo, acerte-se num modelo que privilegie a classe mais promissora do maior desenvolvimento pessoal, social e civilizacional."
(?)
Não posso concordar de modo algum. É um facto que tudo se encaminha para que o português, entre o emprego e a segurança dum lado e a liberdade do outro, escolha as primeiras.

Lê a palestra proferida por Leonardo Boff durante o Fórum Social Mundial, em Belém do Pará.

www.forumsocialmundial.org.br

www.leonardoboff.com.br

 
Às 21 fevereiro, 2009 19:53 , Blogger Papoila disse...

Peter :
Cada vez me convenço mais que Saramago é visionário...
Beijos

 
Às 21 fevereiro, 2009 22:14 , Blogger Peter disse...

Papoila

Porquê? Confesso ser um ignorante da obra de Saramago, embora tenha vários livros dele, mas nunca cheguei ao fim de nenhum.

 
Às 21 fevereiro, 2009 22:40 , Blogger vbm disse...

.

Há que distinguir diagnóstico e prescrição. Aos cinquenta anos de corporativismo paternalista sucederam-se trinta anos de corporativismo sindicalista.

Não havia antes, não há agora, igualdade dos cidadãos face à lei nem perante o poder porque são desiguais as leis segundo a "corporação" em que cada cidadão se integra.

Por exemplo, um funcionário público tem emprego para a vida; um professor não é avaliado; um contratado a prazo é posto no desemprego; um empregado despedido é reintegrado pelo tribunal na empresa que o despediu; um capitalista não paga impostos, etc.

Uma sociedade evolui quando os seus cidadãos se desenvolvem economica, social e intelectualmente.

O impulso para esse crescimento é dado por uma classe dirigente que trabalhe com inteligência, mostre ser confiável na cooperação social, e não tolere corruptores e corruptos, antes os detenha, julgue, exproprie e prenda.

 
Às 21 fevereiro, 2009 23:44 , Blogger Peter disse...

Como não existe essa classe dirigente, chegámos a isto...

Li hoje o artigo "Façamos de conta", escrito pelo jornalista Mário Crespo e publicado no Jornal de Notícias. Não conhecia. Já o leste?

 
Às 22 fevereiro, 2009 00:07 , Blogger vbm disse...

:)

Não, Peter, não li. Ouço-o com frequência na Sic-Notícias e vá lá que não é dos piores; ao menos entrevista cidadãos letrados, em vez de jornalistas, e deixa-os falar.

Sabes o que é anesteziante na televisão e no jornalismo? Há sonegação de factos; não há argumentos; nem raciocínio.

Por exemplo, "Como está agora a Grécia, depois das convulsões do final do ano passado?" Sabes? Não sabes, nem saberás, porque eles não se ocupam mais disso.

É por isto que não leio jornalistas-'escritores'.

 

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