Dois casos a ponderar
“Agora que a continuidade da participação na Zona Euro de países economicamente débeis como Portugal e a Grécia parece estar posta em causa, convém recordar duas experiências de união monetária
(ou quase) que podem ilustrar as consequências da permanência ou da saída do euro.
Em 1989, caiu o muro de Berlim. Logo em 1990, a Alemanha se reunificou politicamente e monetariamente: ou seja, por decisão do governo alemão, o marco da República Democrática passou a valer o mesmo que o marco da República Federal. Desta forma, tal como Portugal com o euro, a Alemanha Democrática entrou para uma união monetária com um câmbio demasiado alto e sem uma estrutura produtiva que aguentasse uma moeda forte. O resultado é que passados vinte anos de massivas transferências de dinheiro para o Leste, quer por parte do governo federal quer por parte da União Europeia, os estados do leste alemão continuam pobres e com taxas de desemprego de dois dígitos.
O segundo exemplo é a Argentina. A Argentina ligou a sua moeda ao dólar nos anos noventa. O resultado foi que perdeu competitividade e, assim, acumulou dívida externa que a fez entrar em bancarrota. Isto - note-se - apesar de ter um orçamento quase equilibrado. Quando, a partir de 2002, se libertou dessa quase união monetária com o dólar, e depois de uma quebra grande em 2003, a Argentina tem tido uma taxa de crescimento média anual do PIB de 7,5% e já fez descer o desemprego para baixo dos 8% da população activa, quando em 2003 tinha mais de 20% de desempregados. Foi um processo muito penoso a saída da ligação ao dólar - os argentinos deixaram apodrecer demasiado a situação - mas valeu a pena. A Argentina não está hoje isenta de problemas (o principal dos quais é a inflação) mas tem um futuro à sua frente, coisa que não tinha antes da bancarrota.
Penso que quem olhar com cuidado para estes dois exemplos, aceitará com naturalidade que a saída de Portugal da Zona Euro é uma opção que deve ser encarada de forma séria e sem dogmatismos nem preconceitos.”
(João Ferreira do Amaral – economista, in “página1” de 23JUN2011)