sábado, dezembro 20

O maior fracasso da democracia portuguesa

“Portugal tem um défice de responsabilidade civil, criminal e moral muito maior do que o seu défice financeiro, e nenhum português se preocupa com isso apesar de pagar os custos da morosidade, do secretismo, do encobrimento, do compadrio e da corrupção. Os portugueses, na sua infinita e pacata desordem existencial, acham tudo "normal" e encolhem os ombros. Por uma vez gostava que em Portugal alguma coisa tivesse um fim, ponto final, assunto arrumado. Não se fala mais nisso. Vivemos no país mais inconclusivo do mundo, em permanente agitação sobre tudo e sem concluir nada.
Desde os Templários e as obras de Santa Engrácia, que se sabe que, nada acaba em Portugal, nada é levado às últimas consequências, nada é definitivo e tudo é improvisado, temporário, desenrascado.

Da morte de Francisco Sá Carneiro e do eterno mistério que a rodeia, foi crime, não foi crime, ao desaparecimento de Madeleine McCann ou ao processo Casa Pia, sabemos de antemão que nunca saberemos o fim destas histórias, nem o que verdadeiramente se passou nem quem são os criminosos ou quantos crimes houve.
Tudo a que temos direito são informações caídas a conta-gotas, pedaços de enigma, peças do quebra-cabeças.
Habituámo-nos a prescindir de saber a verdade porque intimamente achamos que não saber o final da história, ou sabê-lo muitos anos depois, são coisas normais em Portugal. E os novos códigos Penal e de Processo Penal em nada vão mudar este estado de coisas.
Apesar dos jornais e das televisões, dos blogues, dos computadores e da Internet, apesar de termos acesso em tempo real ao maior número de notícias de sempre, continuamos sem saber nada e esperando, com toda a naturalidade, nunca vir a saber.

Passado o prazo da intriga e do sensacionalismo, todos os casos são arquivados nas gavetas das nossas consciências e condenados ao esquecimento.
Ninguém quer saber a verdade. Ou, pelo menos, tentar saber a verdade.
Nunca saberemos a verdade sobre o caso Casa Pia, nem saberemos quem eram as redes e os "senhores importantes" que abusaram, abusam e abusarão de crianças em Portugal, sejam rapazes ou raparigas, visto que os abusos sobre meninas ficaram sempre na sombra.

Existe em Portugal uma camada subterrânea de segredos e injustiças , de protecções e lavagens , de corporações e famílias , de eminências e reputações, de dinheiros e negociações que impede a escavação da verdade.”

(É uma adaptação de um artigo muito mais extenso e julgo que com outro título, publicado no “Expresso” por Clara Ferreira Alves. Procurei tratar do assunto em termos gerais, que julgo serem do interesse comum e que são do conhecimento público, evitando especificar ou citar nomes, porque sim … ninguém é culpado, somos todos culpados.)

7 Comentários:

Às 20 dezembro, 2008 10:17 , Blogger antonio ganhão disse...

Ficamos satisfeitos porque um jornalista iraquiano atirou um par de sapatos ao Bush. Precisamos de mais?

O país só se endireita quando acabarem definitivamente os fundos comunitários. Enquanto estes existirem, confiaremos mais nos Valentins Loureiros, Fátimas Felgueiras e Isaltinos... eles melhor que ninguém sabem captar esses fundos. Quando o dinheiro for só nosso... outro galo cantará. Espero eu!

 
Às 20 dezembro, 2008 10:58 , Blogger Unknown disse...

quem e quantas vezes usa o 'Livro de Reclamações' nas imensas vezes em que lhe é prestado um mau serviço? se ainda não conseguimos exercer a cidadania em coisas que nos dizem directamente respeito (por preguiça? por descrédito nos resultados?) como esperar uma posição em questões de âmbito mais geral (mas também nossas, porque vivemos neste país)?
parece que a democracia tem estados de desenvolvimento muito diferentes dos humanos. parece que aos 34 anos ainda andará pela 1ª infância ;-)
Lou

 
Às 20 dezembro, 2008 11:30 , Blogger Peter disse...

antonio - o implume

Por isso a Inglaterra não quiz o Euro.

 
Às 20 dezembro, 2008 11:38 , Blogger Peter disse...

Lou

Esta semana aqui num pequeno supermercado de bairro, que explora miseravelmente as empregadas, quiz pagar o pequeno almoço e ninguém me atendia. Apenas duas empregadas: uma a atender clientes e outra fora do balcão a tomar o pequeno almoço, eram cerca das 11h. Pedi a esta se não se importava de receber o dinheiro, pois estava com pressa. Respondeu-me: "estou a tomar o pequeno almoço".
Vim -me embora e vieram atrás de mim. Voltei, paguei e pedi o livro de reclamações, mas depois tive pena delas e rasguei a folha.
No fundo o culpado é o patrão que não mete mais pessoal.

 
Às 20 dezembro, 2008 12:46 , Blogger vbm disse...

«Quando o dinheiro for só nosso...
outro galo cantará.
Espero eu!»


Interessante!

Ainda não tinha pensado nisso,
dessa maneira!

É realmente um princípio da teoria económica dar prioridade às aplicações de recursos de maior «eficácia marginal de capital», ao fim e ao cabo, as utilizações que correspondem à maior urgência, utilidade, as de maior prioridade.

Este é um princípio que os 'leigos' - isto é, os que não são nem economistas nem 'judeus', ou aqueles que 'decidem com o dinheiro dos outros' -, tendem a destituir em benefício de obras visíveis, de auto-propaganda, de prestígio técnico de engenharia, etc., etc, (ou simplesmente, preferindo as despesas que lhes angariem as melhores 'comissões'), assim prejudicando o interesse geral, o mais necessário à comunidade e não subordinado a interesses particulares.


- A fim de não ser mal interpretado é por este princípio que considero dever dar-se prioridade à prossecução de barragens nos rios - incluindo inundar as gravuras de Foz Côa ( que "não sabem nadar", mas "não morrem afogadas") - assim como alargar-se o terminal de contentores de Alcântara (as vistas do rio 'captam-se' em Belém!) - sem prejuízo de eventualmente abrir o concurso de atribuição do prolongamento da concessão.

 
Às 20 dezembro, 2008 20:51 , Blogger Manuel Veiga disse...

"ninguém é culpado,somos todos culpados...". compreendo. como ironia...

abraços natalícios.

 
Às 21 dezembro, 2008 10:27 , Blogger Tiago R Cardoso disse...

com naturalidade assumimos que ninguém será culpado, que tudo é arquivado, nem mais.

 

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