quinta-feira, outubro 23

Há músicas e músicas

Para variar vamos falar de um assunto para o qual tenho especial sensibilidade.
A música.
Não, não vamos estar aqui a falar de clássicos e pimbas, rock ou tecno e ect…
Não. A ideia é falar sobre o quanto é muito fácil e, ao mesmo tempo, demasiado difícil, editar ou fazer chegar o trabalho dos (alguns) músicos portugueses ao público.

Primeiro a facilidade.
Qualquer um de nós, com alguma sensibilidade para a música que lhe apetece fazer, pode expor o que vai fazendo em casa, seja a solo ou em grupo. O MySpace, YouTube, entre outros, permitem aos músicos, tal como os blogues permitem expor opiniões, poesia, prosa, etc., promoverem os seus trabalhos e, em alguns casos assinarem com uma editora que lhe faça a promoção, os coloque nas rádios, televisões, etc.
Um bom conjunto de amigos, alguns conhecimentos, podem fazer com que a música seja ouvida por várias pessoas que podem criticar, gostar ou não, contratar para espectáculos, etc.
Bem bom para tantos talentos que se vão ouvindo por essa Internet.

As dificuldades
Primeiro, os preços dos instrumentos. Mesmo com as actuais promoções, um instrumento de qualidade média ainda é caro. A taxa de IVA é escandalosa.
Depois, o local para ensaios. Vão existindo estúdios mas para se fazer um trabalho decente, a renda é um descalabro.

A seguir vem a entrada numa editora. Bem, quando se consegue chegar ao responsável pela audição dos trabalhos (mesmo que já em fase de edição, ou seja sem custos de produção para a editora), os músicos esbarram com a questão comercial. A música passa a ser um produto e se o indivíduo não lhe encontra esse valor (mesmo quando já se deram concertos – e há muitos exemplos), nada feito.
“Isto é bom mas não vende” – diz.

Quando é edição de autor, então a coisa complica-se.
Os projectos andam a passear de rádio em rádio, de promotor em promotor e nada. Sobretudo se a estética não está na moda. E as modas são tantas e voláteis...
Se pensarmos um pouco, não muito sequer, vêm-nos à memória alguns projectos musicais que sobrevivem para lá das nossas fronteiras e que cá, ou não entram ou entram quando se afirmaram fora de portas.

Termino com um comentário do maestro Vitorino de Almeida, há dias numa mesa de café: “… excepto alguma música ligeira… (e deu dois ou três nomes) … eles (a rádio) não passa. Ninguém quer saber do que se anda fazer. E o que conta é o que se passa em Lisboa e no Porto (e deu exemplos de auditórios destas cidades, vazios com grande promoção, em contraponto com concertos com centenas de pessoas em cidades ou vilas fora destes centros)”.
Passe o exagero, a realidade não é muito diferente desta observação.


Foi longo? E o que tive que cortar?


(Foto: Ant)

4 Comentários:

Às 23 outubro, 2008 20:14 , Blogger vbm disse...

Penso, por causa do que ando a ler - "O cisne negro" de Nassim Taleb -, que os artistas deveriam encarar a sua arte, não como um modo de vida, a que a fortuna pode sorrir, mas como um amor, um prazer, um hábito. Com esse estado de espírito, alhear-se-iam das rádios, dos jornalistas, da televisão e das discográficas. Simplesmente viviam, mais a sua arte de amar. Nesse interim, uma natural audiência de proximidade lhes encherá o coração de afectos. Divulgar ao grande público é coisa que virá ou não virá mas que, certo, não equivale à criatividade da arte que se vive. Dou um exemplo: - «Anos a fio, nunca fui à América do Norte. Mas, desde novo, sempre me desinteressei de a conhecer, salvo New Orleans - um dos três pontos de música do continente americano, a par da Baía/Rio e Cuba. Sucedeu-me, um belo dia, ter a possibilidade de ir directo não à América, sim a New Orleans (antes do hurricane): Pois bem, tocou-me, como esperava, a música: não a música dos discos, do cinema, das grandes estrelas; mas, a música diária das ruas, dos bares e cafés, tocada sem microfones, lado a lado da tua própria mesa, na envolvência da sala ou da esquina de rua. À arte realizada e vívida, eu a reconheço. Claro, posso ouvir um disco. Mil vezes. Nada é comparado com a situação em que a cantora, a fadista cantasse ao vivo para mim, ou em pequeno grupo. Gosto justamente do amadorismo do fado. Não é preciso uma editora para o cantar. Levantas-te e cantas. Não somos nós que temos de andar a trás dos jornalistas para que divulguem a nossa arte. Eles que venham ter connosco e nos procurem. Nós simplesmente cultivamos as flores do jardim que amamos. É como se começa: cantar de graça, pintar para os amigos, escrever para si próprio. Evoluir disso para o grande público? Este que "nos" procure, se quiser encontrar algo melhor do que o que conhece.

 
Às 23 outubro, 2008 20:31 , Blogger Peter disse...

Meu caro amigo e companheiro de blog, li "de fio a pavio" o teu texto que considerei muito oportuno. E oportuno porque quem passa por aqui a lamentar-se são os poetas e, no fim, os desgraçados dos músicos debatem-se com maiores dificuldades.

És como eu, ninguém nos liga ...

Mas "quem corre por gosto não cansa": tu na música e eu nas explosões emissoras de raios gama.LOL

 
Às 23 outubro, 2008 21:46 , Blogger Peter disse...

Meu caro amigo e companheiro de blog, li "de fio a pavio" o teu texto. Afinal tens mais problemas em tornar conhecida a tua música e a tua voz, do que os poetas em publicar os seus versos.
Junta-te a mim, ninguém comenta o meu texto sobre os raios cósmicos :(
É como o Vasco diz: o que é importante é termos satisfação naquilo que fazemos.

Abraço.

 
Às 24 outubro, 2008 14:59 , Blogger Ant disse...

vbm, se alguma vez pensei em ser músico profissional, foi em miúdo. Mais tarde, concluí que para isso teria que fazer muitas concessões, coisa que em cada dia me apetece fazer menos.
Admito, no entanto, que haverá quem o queira fazer.
O que está em causa, mau amigo, é a dificuldade que quem produz arte neste país, seja ela qual for (há uns subsídios e umas bolsas é certo para as cosas mais eruditas) tem imensa dificuldade em aceder ao direito de chegar às pessoas. Mais, o público em geral deveria ter acesso Às coisas que se vão fazendo para poder optar verdadeiramente.
Dou-te um exemplo: sabes o trabalho que é ir à FNAC e conseguir a "esmola" de uma apresentação do teu trabalho?
é que a coisa depende do dia em te encontras com o responsável, se ele gosta da tua cara, etc.

Termino com a menção aos maiores compositores (Wagner, Mozart, Bach e todos os outros que sabemos). Que seria deles e de nós se não fossem os mecenas?
E na pintura?
E etc?
:)))

Mas entendi perfeitamente o que dizes. E é isso que eu faço.
O que quero, e o que me diverte.

Abraço

Peter,mistura umas aventuras amorosas nas tuas dissertações e vais ver o que chove...
heheheheh

Abraços

 

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