sexta-feira, fevereiro 3

O NADA

O deter-me na vírgula temendo que esta seja sempre e só um ponto a que não quero chamar final, mas sabendo [a terrível certeza] que para além dela apenas está o esquecimento. Todas as palavras após esse interlúdio – colocado para respirar? – têm o valor numérico de algarismos à esquerda da mesma. Ainda e quando colocadas depois deste pequeno sinal, são a constatação da desvalorização e da inutilidade.

[Espreitar-te entre as réguas finas e azuis de um estore e obter imagens entrecortadas como se o corpo se tivesse separado em vários] entre grades brancas e espaços exíguos, agora dedos alongados e enregelados pelo frio intenso e cortante.

Pequenos insectos esbarram de encontro ao vidro invisível mercê da luz que este espelha. São os baços de vidas curtas, sem sentido, oblíquas e enviesadas.

Agora o voo rasante junto ao chão tentando saber através deste que os passos importantes de uma vida se registaram ali e ficaram impressos na invisibilidade.

[A descrença na existência] não são mais do que lucubrações alucinogéneas de algo que gostaria real mas que simplesmente não existe.

Vaguear nesta incomensurável nitidez de solidão fazendo de cada momento o vazio e [a sempre desesperante vontade de que tudo termine] a intersecção de pontos convergentes que se afastam fatalmente porque um dos dois sucumbiu.

Ainda sem o beijo, sem planos [porque o futuro não existe] sem vontades e sem finalidades a desejar o vórtice de um terminus de algo que jamais existiu.

Talvez a apaziguação do sonho no esventrar de estilhaços de corpos, mentes e almas adjacentes e o esbarrar de encontro ao muro intransponível da inutilidade.

Ontem como hoje, o nada.
Amanhã não existe.

7 Comentários:

Às 03 fevereiro, 2006 19:23 , Blogger Ana disse...

Gostei muito, mas muito mesmo*

 
Às 03 fevereiro, 2006 21:50 , Blogger Peter disse...

"Amanhã não existe", escreves, não existirá para quem já não viver, mas existirá como existirão "Todas as manhãs do mundo", lembras-te deste livro e filme?

“O vasto mundo: um grão de poeira no espaço.
Toda a ciência dos homens: palavras.
Os povos, os animais e flores dos sete climas: sombras.
O resultado da tua perpétua meditação: nada.”

(Omar Khayyam, “Rubaiyat” 26)

 
Às 03 fevereiro, 2006 22:04 , Blogger Su disse...

tudo reduzido ao nada?
jocas maradas de tempos

 
Às 04 fevereiro, 2006 03:47 , Blogger Fragmentos Betty Martins disse...

Olá Zé

Entre o livro e a paisagem...
o toque
o toque da brisa
neste lugar
tão inconcrecto
como um fogo
saído da sombra dos astros
tudo cresce
como vestígio
de uma morte inacessível
motor quase parado
nas
margens de uma fotografia
somos presenças
nos limites da vertigem
ângulos
na penumbra
de uma realidade

insuspeitada...

Um beijo...

Bfs

 
Às 04 fevereiro, 2006 12:33 , Blogger BlueShell disse...

Vidas sem sentido...vazias...cruéis existências que teimam em não se extinguir!

 
Às 04 fevereiro, 2006 19:52 , Anonymous Anónimo disse...

O amanhã existe enquanto nós existirmos. Pode é não corresponder ao que desejamos. Mesmo assim temos de crer no amanhã e não deixar que a virgula se transforme em ponto final,. Tanta amargura nesse coração?...
Um beijinho

 
Às 04 fevereiro, 2006 21:00 , Blogger Heloisa B.P disse...

"O NADA", "GEMEO DO COISA NENHUMA"!!!
_Excelentemente escrito (nao e' novidade!)!!

_Destaco:

"Talvez a apaziguação do sonho no esventrar de estilhaços de corpos, mentes e almas adjacentes e o esbarrar de encontro ao muro intransponível da inutilidade.

Ontem como hoje, o nada.
Amanhã não existe."
.........................TALVEZ!...
Concordo e... discordo: a um tempo!
_HOJE!(?)...
_AMANHA!(?)...
.................."SONHO APAZIGUADO"...Se, o !"Apaziguarmos"...deixa de ser SONHO!Ficara', talvez... "amorfo desejo", sem ENERGIA, para ultrapassar o "MURO INTRANSPONIVEL DA INUTILIDADE"!..........
.......................Aqui fica meu Abraco, que, pode ser uma IRREALIDADE; pois, que nao pode vencer o "intransponivel muro, das aguas profundas e tormentosas, de um IMENSO OCEANO!...
...................Heloisa.
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