quarta-feira, janeiro 7

Benzidos e heréticos…

A guerra é uma merda!
Eu convivo com ela, de forma indirecta desde que nasci. O meu pai foi militar da Marinha de Guerra. Quando nasci estava na Guiné. Regressou para ser internado no Caramulo.
Convivi com mutilados. Um deles com estilhaços na cabeça.
Ouvi gritos de dor.
Não precisei de lá estar. A guerra chegava até mim.

Por isso, quando vejo as imagens, e só para falar destas últimas, de Gaza, fico ao mesmo tempo revoltado e triste.
Revoltado porque, e enquanto Objector de Consciência convicto, qualquer forma de violência me é agressiva, invasiva. Triste porque aquelas imagens não são ficção. São uma realidade que se vai revelar cada vez mais muito mais violenta que a fantasia.

Analisar estes últimos conflitos entre Palestinianos e Judeus à luz destes combates é redutor. Esta é uma guerra ancestral. Um ódio que se não resolve. Que se alimenta da própria guerra.

Nunca fui um grande admirador da causa palestiniana. Sempre me pareceu que nesta luta por aquele território há uma teimosia que excede qualquer fundamento, mesmo que, eventualmente, justo.
O Estado judaico, poderoso, dono de vários lobbies em todo o mundo, nomeadamente nos EU, mantém uma atitude que, se genuína, acaba por ser excessiva e implacável.

Vejamos, então, outros contornos da questão.
Já tenho referido antes que um povo que transforma um deserto num laranjal merece algum respeito. Depois do holocausto (que parece que sempre aconteceu, ao contrário do que já ouvimos por aí), não foi fácil transformar aquele território no que ele é hoje.
No que diz respeito à maioria dos povos árabes e muçulmanos que observamos? Quais as suas actividades económicas?
Geralmente estão ligadas à produção e venda de armamentos e drogas.
Os governos destes países raramente se caracterizam por serem democratas ou lá perto. A diferença entre ricos e pobres não tem nada a ver com o que se passa no ocidente.
Os ricos são ostensivamente ricos, pornograficamente poderosos, diria mesmo.
As pessoas não valem um cêntimo. São educadas para serem fundamentalistas. Desde miúdos que vivem uma realidade de violência, nascem com ela.

A religião islâmica interpreta, hoje, as suas Escrituras como os Judeus faziam antes de Cristo. Aliás, ele morreu por isso mesmo. Porque pôs em causa, não a Lei, mas o modo como era administrada.
É infame o modo como a Fé é usada para dominar os povos. Seja no oriente ou no ocidente (também não somos assim tão inócuos). A verdade é que aquela gente vive desta dicotomia religião/violência. É o paradoxo trágico da ignorância.

O Hamas rompeu as tréguas. A troco de uma jihad, mostra ao mundo como está ser agredido. Mostra as crianças, as escolas e os hospitais. Mostra os corpos mutilados. O mundo é confrontado com este horror de pessoas inocentes que morrem por causas pouco inocentes.
Israel ataca para matar.
Olho por olho, dente por dente.
Correcto? Já nem se coloca esta questão.
Aquilo é uma guerra. Haverá mortos de ambos os lados. Talvez mais no lado dos islâmicos.

A verdade é que já me custa admitir conviver com gente que exige que mudemos o nosso estilo de vida, a nossa religião, a nossa Fé, a nossa integridade.
Ainda não vi nenhum daqueles idiotas defender a exploração de crianças no comércio de droga ou em trabalhos que nem adultos querem fazer.
Não os vejo condenar o uso de crianças como bombas. Não os vejo querer de facto evoluir em qualquer sentido que seja.
Querem, isso sim, que nós passemos a ser, obrigatoriamente como eles.

Não os vejo preocupados com a fome, a sede, a falta de estruturas de saúde, com a cultura, com o lazer.
Não. Eles mantêm que devemos ser todos religiosos. Mas islâmicos.

A guerra é uma merda.
E nós estamos metidos nela até ao pescoço.
Porque somos cúmplices, porque somos pacíficos (não pacifistas).
Porque convivemos alegremente com esta gente. Admitimos as suas práticas, as suas leis, as suas regras.
Temos negócios com eles. E sabemos que negócios são e o que provocam.

Na verdade quem somos nós para apontar o dedo seja a quem for se pactuamos com estes regimes?
Afinal até é pitoresco passar férias no oriente. O deserto é lindo, andar de camelo é fantástico, as pirâmides um espectáculo.

Mal comparado é como protestarmos contra os ciganos por não pagarem impostos e sermos clientes porque é mais barato.
É como sabermos que os chineses exploram os seus trabalhadores e comprarmos aquelas coisinhas giras e baratas.

A guerra é uma merda mas não se faz só de mortos e feridos e de horrores.
Essas são as imagens imediatas que nos chocam.
O resto está escondido em cada acto que não temos em cada grito que calamos.

9 Comentários:

Às 07 janeiro, 2009 12:12 , Blogger Ant disse...

desculpem lá o tamanho mas qunado se começa...

 
Às 07 janeiro, 2009 14:11 , Anonymous Anónimo disse...

... é dificil acabar, sobretudo quando se expressa de forma sincera o que nos vai na alma!
Bom texto.

No plano da propaganda e influência da opinião pública veja-se http://www.elfarra.org/gallery/gaza.htm.
[imagens sugestivas]

 
Às 07 janeiro, 2009 16:47 , Blogger alf disse...

É preciso irmos à essência da questão.

Antigamente, quando, por uma revolução ou conquista, um governo era derrotado, os novos governantes chacinavam todos os vencidos, todos os familiares dos vencidos. Se o não fizessem, esses necessariamente lutariam contra eles.

Não chacinavam necessariamente os povos porque os povos não tinham nada a ver com os governantes, faziam parte da terra. Matavam-se os Senhores e os que estavam com eles.

Nas batalhas, não havia prisioneiros - os exercitos adversários eram dizimados, os soldados adversários derrotados eram decapitados um a um (ou afogados).

Os povos podem aceitar ser «conquistados» se isso melhorar as suas condições de vida - por exemplo, as pessoas de Olivença estão muito bem como espanhóis, melhor do que se fossem portugueses.

Os judeus conquistaram a palestina às pessoas que lá viviam; Mas não chacinaram todos nem lhes deram melhores condições de vida. Não foi apenas uma mudança de governo - o povo palestiniano foi expulso de suas casas e enviado para o deserto interior.

Mas as conquistas só alcançam a paz por duas vias: chacina dos conquistados ou a sua «compra» com melhores condições de vida.

O projecto de israel é claro e só não percebe quem não quer, porque as pessoas têm sempre dificuldade em aceitar estas coisas.

Os palestinianos vivem em puros campos de concentração. Nenhuma organização social é permitida nesses campos - Israel faz incursões periódicas para garantir que nenhuns serviços funcionam, que não há coisas tão elementares como um registo de propriedades, por exemplo.

Depois, é só uma questão de tempo. Tornando impossível qualquer organização, os palestinianos acabarão por se extinguir - algum palestiniano tem alguma perspectiva de futuro? Claro que não. Eles sabem que viverão eternamente num campo de concentração num deserto, que nem sequer podem modificar porque nenhuma organização lhes é permitida.

Não é por acaso que Israel fez uma incursão militar há uns anos para destruir os sistemas informáticos oferecidos pelos suecos, destinados ao registo da propriedade, e que agora se preocupou em destruir as escolas da ONU.

Israel só tem uma alternativa possivel a esta política de destruição dos palestinianos - seria indemniza-los da expropriação que fez do seu território. Transformar em negócio o que foi conquista.

Mas não quer seguir essa via. A actual tem muitas vantagens para Israel - fortalece a ideia de que é um pais, entre outras.

Assim, iremos continuar a assistir ao que estamos a assistir, à lenta chacina dos palestinianos por via psicológica (um povo a quem roubaram o horizonte só pode definhar e morrer); estas incursões militares são só para garantir que os «prisioneiros» não estabelecem nenhuma forma de organização - é a forma de gerir campos de concentração desta dimensão, nada mais.


E, claro, nós fechamos os olhos, porque, no fundo, sabemos que as conquistas exigem a chacina dos conquistados; eu, como sou um chato, aproveito este seu post para lançar uma alternativa: e porque é que Israel não desenvolve antes uma alternativa negocial, de comprar aos palestinianos o território que lhes ocupou?

 
Às 07 janeiro, 2009 17:32 , Blogger Peter disse...

ant

Belíssimo texto e muito mais haveria a dizer.
Destaco:
«A verdade é que já me custa admitir conviver com gente que exige que mudemos o nosso estilo de vida, a nossa religião, a nossa Fé, a nossa integridade.
Ainda não vi nenhum daqueles idiotas defender a exploração de crianças no comércio de droga ou em trabalhos que nem adultos querem fazer.
Não os vejo condenar o uso de crianças como bombas. Não os vejo querer de facto evoluir em qualquer sentido que seja.
Querem, isso sim, que nós passemos a ser, obrigatoriamente como eles.»

Durante mais de metade do sec XX, as "direitas" - europeia, portuguesa e americana - eram anti-semitas. Salazar marcava os passaportes judeus com tinta vermelha.Os primeiros líderes, Ben Gurion ou Golda Meir eram russos e socialistas e Estaline , depois da IIGM, fornecia o armamento.
Nos anos 70 o tema rodou 180º; o choque petrolífero e o terrorismo, geraram a antipatia nas "direitas" contra os árabes, e em 79, quando Reagan chegou à presidência dos EUA, o Mundo já invertera as simpatias: as "direitas" eram agora pró-Israel e as "esquerdas" pró-palestinianas e assim tem sido até hoje.

Sugiro a leitura da "carta ao director" do PÚBLICO de hoje, escrita por Luís Nascimento, jornalista, sobre factos testemunhados por ele durante uma reportagem que fez naqueles locais, nomeadamente na Galileia, em 2000.
É um testemunho directo e não por "ouvir dizer"...

 
Às 07 janeiro, 2009 21:16 , Blogger JOY disse...

Belissimo texto, concordo na generalidade com o seu conteudo.
Nesta guerra temos de um lado a ganância e a arrogância Isrealita do outro lado o fanatismo religioso, que retira clarividência aos palestinianos.
Mas a verdade é que a guerra É UMA MERDA

Um abraço
Joy

 
Às 07 janeiro, 2009 21:22 , Blogger Papoila disse...

A guerra é uma merda! Tudo mas tudo que está por trás dela uma verdadeira trampa... Belíssimo texto! A guerra só acontece porque as posições se extremaram e todos se "marimbam" para os que na verdade sofrem com ela.
A guerra santa é uma merda absurda.

 
Às 08 janeiro, 2009 00:33 , Blogger Peter disse...

Médio Oriente: Israel, Hamas e palestinianos reúnem-se no Cairo quinta-feira

07 de Janeiro de 2009, 23:10

Nações Unidas, Nova Iorque, 07 Jan (Lusa) - O embaixador do Egipto nas Nações Unidas disse hoje que representantes de Israel, dos palestinos e do movimento de resistência islâmico Hamas, concordaram em reunir-se quinta-feira para conversações mediadas pelo Egipto no Cairo.

Maged Abdelaziz disse que "toda a gente concordou em enviar uma delegação técnica" para conversações sobre uma proposta de trégua franco-egípcia, cujos termos permanecem ainda pouco claros.

O plano apela para um cessar-fogo imediato no conflito entre Israel e o Hamas por um período limitado para permitir a ajuda humanitária a Gaza.

O presidente francês, Nicolas Sarkozy, já disse que Israel e a Autoridade Palestiniana, moderada e rival do Hamas, aceitou o plano, embora não seja parte directa no conflito.

TM.

Lusa/Fim

 
Às 08 janeiro, 2009 17:26 , Blogger Paula Raposo disse...

Gostei muito de te ler, Ant! Um beijo para ti.

 
Às 09 janeiro, 2009 10:29 , Blogger vbm disse...

Também gostei do texto do Ant, embora haja que reflectir no que diz o Alf. Se bem que, no argumentário deste, é dito os judeus não terem indemnizado os palestinianos, mas, ao que sempre ouvi contar, eles, judeus, começaram a comprar terras aos autóctones desde oa anos 20, embora, claro, a preços irrisórios, assim tipo espanhóis no Alqueva aos alentejanos!

A não haver uma retirada dos judeus da Palestina, não vislumbro outra solução que não seja a de separação territorial nítida e definitiva, mantendo Jerusalém com um estatuto anacional, de regulado acesso aos crentes das três religiões mediterrânicas monoteístas.

O que eu acho mais irónico no meio desta palhaçada mortífera é que os verdadeiros judeus-descendentes são até os palestinianos e não os 'retornados' de uma pseudo-diáspora dum proselitismo judaico no Yémen, Rússia, Marrocos, Península Ibérica!

 

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