O uivo II
I
o uivo
é uma sensação
som estranho
sempre presente.
o uivo
está de noite
está de dia
está onde se estiver.
está onde se quizer.
pode ser a ambição
ou bater de coração
pode ser nostalgia
ou banho de água fria.
deve ser fome e sede
medo de solidão
e breu
e maldição
e putrefacção.
só posso ser eu
a inventar
porque não recordo
como acordei de noite,
lençóis frios.
e os meus gritos
de dor abafada
pela solidão do breu
transformam-se
em uivo
de lobo faminto,
lobo velho, impotente
para agarrar as presas
mais fáceis.
II
e o uivo,
uiva na cidade
e é mais alto
que o ruído
das rodas
e dos passos apressados.
é mais alto
que o choro da minha mãe
por não ter o homem dela
que é o meu pai,
para a consolar
da minha partida,
sem aviso,
sem destino.
eu,
o menino dela,
que não fui homem
quando ela quis.
eu,
que não fui criança
quando homem feito.
eu,
que não esperei
pelo entardecer.
porque ao entardecer
ela não deixaria
partir sem um “adeus”.
é mais alto
que a raiva do meu pai
porque assim
tem de aceitar
ser o homem da mulher,
que é a minha mãe.
tem de aceitar
ficar em casa
e abrir os braços
e os lábios
num sorriso.
tem que despir as calças
tem de se vir
dentro das coxas
de onde eu saí
e jamais regressarei.
tem de ser homem
enfim,
antes que a morte
o impeça de viver.
tem de se perder
como se perdeu
antes da primeira vez.
regressar à juventude
e fazê-la gozar
na ilusão
de jovem inocente
de desejos inocentes.
em cada esquina
é este grito
feito uivo
que todos ouvem
porque me calo.
é este uivo que soa
porque não pertenço
a terra nenhuma.
porque não tenho religião.
porque esqueci orações,
porque aprendi lições.
porque ouvi política
e teorias diversas,
até já nada fazer
senão fechar os ouvidos
e fechar os olhos.
deus que está no céu
sentado a pensar e a tudo ver,
sabe que estou vivo.
mas eu,
eu uivo incessantemente.
e o meu uivo,
como o do lobo velho,
ninguém o entende
senão os velhos caçadores
que já não sabem viver
senão nas montanhas,
entre as neves
e o silêncio
e os uivos.
(Foto: Google...)
10 Comentários:
Eu sei... o Gisnberg foi inspiração, claro, há uns anitos.
"é este uivo que soa
porque não pertenço
a terra nenhuma.
porque não tenho religião.
porque esqueci orações,
porque aprendi lições.
porque ouvi política
e teorias diversas,
até já nada fazer
senão fechar os ouvidos
e fechar os olhos.
deus que está no céu
sentado a pensar e a tudo ver,
sabe que estou vivo.
mas eu,
eu uivo incessantemente.
e o meu uivo,
como o do lobo velho,
ninguém o entende
senão os velhos caçadores
que já não sabem viver
senão nas montanhas,
entre as neves
e o silêncio
e os uivos."
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...................
***************************EM SILENCIO,ESCUTO O "UIVO"!...
E...me assombro com a *IMAGEM*!
Perfeito "acasalamento" (se a perfeicao total fosse deste mundo!)!
Heloisa.
---------
Um poema forte que retrata a vida.
Terei de o voltar a ler novamente logo à noite, pausadamente, parando, reflectindo e recordando.
Abraço
Mas marcas a tua passagem pelo mundo, com ou sem uivo.
Poderoso o teu poema, carregado de mensagens e de recordações.
Uma beleza, Ant. E não digo mais nada.
Obrigada
Beijos e abraços
Marta
Olá!!! Gostei muuuuito de passar por aqui!
Jokinhas!
Um grande poema.
No tamano e na qualidade.
Gostei de o ler.
Abraço.
Mas uivas muito bem! :) Poeticamente, está claro.
Beijos
Gostei muito do teu grito , uivo à vida
beijos
uivo de lobo solitário! quem os não solta de vez em quando. gostei de ler. abraços
obrigada querido Ant.
magnifico por aqui.
beijos. mts.
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