sexta-feira, janeiro 13

Inexistência

A inexistência do Tempo tal como o imaginamos contado por sucessão de dias e noites, primaveras tantas vezes cinza, ponteiros de relógios em círculos inexoráveis rodando invariavelmente no sentido dex-trorsum recordam-nos afinal a nossa própria não vida, também nós rodando em trajectos circulares, rodopiando em todos os sentidos perdidos quais baratas tontas.
A intangibilidade do Espaço/Tempo o caminhar no vácuo e para o vácuo remetem-nos à infininesabilidade corpórea de pequenas peças dispensáveis por um universo tão compreensivo que se permite tratar-nos tal qual somos. Lixo.
O arrogarmo-nos donos de sabedorias é o constatar da tremenda ignorância em que nos movemos.
[O percurso inclinado da Pirâmide é algo lento; tanto mais lento quanto o sabermos que atingindo o vértice far-se-á Luz. O que fica além da Luz? - Mais Luz. – Só pode ser essa a resposta.]
Tempo – Templo o clarão que rebentará diante dos incrédulos deixando-os ainda mais cegos porque jamais quiseram ver e aceitar o óbvio.
Elevar-me graças à anulabilidade da força da gravidade num acto tão simples como ignorar esta última permitindo-me o pairar acima da minha própria cabeça que deixo deitada num travesseiro de algodão para dela tenha uma outra visão.
A água que escorre lentamente do fontanário de tão pura e cristalina só é assimilada pelo ruído quase imperceptível da queda onde se desfaz em milhões de estilhaços e gotículas tornando-se na mansidão do espaço preenchido por outras águas vertidas anteriormente e que agora repousam na base. Bebê-la é sorver a vida.
Conduzir:O automóvel tendo sempre uma visão em perspectiva onde tudo parece convergir num ponto distante e a vertigem do espaço percorrido em breves segundos constatando ao mesmo tempo a ausência de árvores devoradas em lancinantes incêndios provocados pela incúria e pela maldade, continua a deixar impressa na mente a ideia de ausência.
As montanhas:Que diviso ao longe mais não são que os teus dois seios erectos e possantes a pedirem o toque da mão e o selar do beijo em mamilos acastanhados e duros.
A caixa:Da qual agora resolvi sair por ser passível de mudança de onda só ao simples tocar de um botão era afinal uma máquina tenebrosa concebida com o único intuito de aprisionar a mente.Essa a razão da aparente fuga. Lucidez. Foi um acto de lucidez.
O frio:Que permite sentir o outro corpo quente e para o qual somos impulsionados compulsivamente, oferecendo este a plena sensação de quietude.
A inexistência do Tempo tal como o imaginamos contado por sucessão de dias e noites, primaveras tantas vezes cinza, ponteiros de relógios em círculos inexoráveis rodando invariavelmente no sentido dex-trorsum…

4 Comentários:

Às 13 janeiro, 2006 13:03 , Anonymous Anónimo disse...

... e se o tempo nunca tivesse existido ...teriamos um problema resolvido... jamais sentiriamos a sua falta

 
Às 13 janeiro, 2006 14:43 , Blogger Peter disse...

letrasaoacaso, brilhante exercício de prosa literária, com toques de poesia e de sensualidade, comme d'habitude.

O Tempo não existe por si só, porque é sempre medido como o espaço que separa dois acontecimentos. Daí o "espaço/tempo". Penso eu de que ... como diz aí o "Papa" do Norte.

 
Às 13 janeiro, 2006 19:53 , Blogger Catarina Santiago Costa disse...

Meu querido,
Costumo dizer que aquilo que está para lá do contínuo espaço/tempo, se algo existe para além dele, é deus. Lógico, não? :]
Zézinho, finalmente consigo escrever-te! Já tentei tantas vezes fazê-lo no InApto (bem sabes o quanto adoro a tua sátira socio-política), mas debalde! Nunca consigo nada, nem inscrevendo-me no teu blog!
Fico sempre babada com os teus elogios e prezo muito as tuas visitas e comentários. Jamais penses que dou a tua atenção por adquirida.
Um grande beijo, obrigada e desculpa-me a negligência

 
Às 14 janeiro, 2006 02:33 , Blogger Fragmentos Betty Martins disse...

Olá Zé

Palavras para o teu texto! Só mesmo sentindo-as...

Deixo-te um poema com um carinho muito especial.

Sem Hora

Ouço os carrilhões
nas tardes amenas
em que a suave brisa acaricia
o meu rosto

No teu corpo
escreves dezembro
mas invento
no papel
a geometria de abril

Os meus bolsos
estão cheios
de palavras
linhas, traços
o céu
um rio
que serenamente
desliza
perante os meus olhos
nas equações do espaço

Deixo que os meus dedos
se percam
procurando
a textura do tempo
ponteiros
faca de corte
certeiro e fino

Mas hoje...

Ao minuto 59
a exactidão
não chegou à hora
tudo volta ao inicio
de ponteiros parados

As horas
agora
conheço-as pelas sombras

As cores os cheiros de abril
derramam-se no papel
carminando os meus dedos

Ao longe
os carrilhões
se fazem ouvir

Tua voz inventada
por mim – momento
meu olhar circunvagante
resgata no ar medidas dum sentimento
coração aberto
sem hora – errante

O beijo...

 

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