O iceberg
Portugal é um iceberg vogando nas águas tormentosas da C.E. Na parte visível aparecem (não quer dizer que ali pertençam) as multidões que enchem os mega-concertos de bandas famosas e que esgotam os bilhetes com meses de antecedência, que lotam os voos para o Nordeste brasileiro, agora já ultrapassado pelas longínquas e paradisíacas praias de ilhas distantes e que enxameiam o Sotavento Algarvio numa comunhão não partilhada com os VIPs, enfim ...
Abaixo da superfície do mar, como todos sabem, encontra-se a parte mais volumosa. É aí que vivem as pessoas que viajam comigo nos transportes colectivos, quando se podem dar a esse luxo e que habitam os prédios dos anos 40, ou mais antigos. Sobretudo viúvas de funcionários, professores primários, empregados do comércio (...) habituadas a um determinado nível de vida, honestas e modestas. Mas também mulheres mais jovens, abandonadas pelos maridos que não sabem onde se encontram e que, portanto, deixaram de receber a pensão a que estes foram obrigados para o sustento delas e dos filhos e que já não têm pais a quem acorrer, pois estes ainda se encontram em pior situação.
- Vê este fogão? Está avariado, mas ainda não está pago.
- E este televisor em cima do frigorífico, está desligado.
- Está avariado, não tenho dinheiro para o mandar arranjar, mas também ainda não está pago.
-Está é da "Financiadora", precisava dum crédito.
- Certamente, nada de mais fácil, quanto precisa? Os nossos juros são iguais aos cobrados pelos cartões de crédito e ainda hoje terá o dinheiro nas suas mãos.
Ela sabe que não poderá pagar, mas que importa, se já não paga as prestações da casa há meses, o mesmo acontecendo com a luz a água e o gás, que dentro em pouco lhe serão desligados. É preciso ir sobrevivendo, não sabe o que lhe vai acontecer e já nem se importa. Alguma coisa se há-de arranjar.
E os habitantes dos bairros degradados?
Estão também na parte submersa, mas mais acima, junto ao mar. De vez em quando deitam a cabeça fora de água. Sobrevivem com "esquemas" e sempre, toda a vida, viveram na miséria e em ambientes degradados.
Mas as novas gerações querem agora e já, aquilo a que se julgam com direito como seres humanos e por isso os "esquemas" de que se servem, muitas vezes entre curtas, ou mais longas estadias na prisão. Por vezes há o azar das coisas correrem mal ...
As "velhas" ainda se vão arrastando como "mulheres a dias", enquanto os maridos vão fazendo "biscates" que por vezes aparecem.
Penso nisso enquanto vou navegando no Titanic. Parece que o navio roçou o iceberg, mas não vai haver azar pois a orquestra continua a tocar ...
12 Comentários:
Pois é...um país de contradições profundas. Também não compreendo o estilo de vida que a maioria das famílias portuguesas leva. Algo de muito estranho que poderá um bom case study.
Olá!
Um excelente texto, Peter.
Dos melhores que tenho lido da tua autoria.
Contundentemente verdadeiro.
Um abraço
Caro Peter, parece-me que te referes, vagamente, ao documentário que passou na TVI sobre a miséria que se vive por aí, chefes de família que ganham 500 euros e a quem retiram à cabeça 200 para pagar dívidas, não pagam as rendas que são mais do que o que ganham e os filhos vão para a escola alimentados a arroz. Já estamos ao nível dos chineses, nem percebo porque temos que ser ainda mais "produtivos".
Abraços
Olá!
Não tens nada que agradecer.
Abraço
excelente texto. e no entanto... os lucros dos bancos sobem de ano para ano...
"herético"
"não vai haver azar pois a orquestra continua a tocar ..."
Sempre a tocar....é o que vai valendo. A orquestra que ainda toca.
pois...pois....pois!!!!!!!!!
e a orquesta continua a tocar!
até ....será que vai acabar também os instrumentos???...ou os dedos para os tocar???
gostei de estar aqui deste lado!
Também gosto de ver um outro...ou será ter?...não ver, ler... hehehehehe...:-#
dá uma espiadinha
http://yoshihiroskyblue.blogspot.com/
beijos
Nada há a acrescentar à tua análise de como se vive neste país de fantasia e de faz de conta, do que te dar os parabéns pelo texto.
Um abraço. Augusto
Amigo Peter, este nosso Titanic até pode não afundar, mas vai de certeza andar à deriva por muito tempo e o iceberg, vai-nos gelando aos poucos até a uma hipotermia fatal!
Resta-nos a tal orquestra, que nos vai dando música para os nossos ouvidos. E porque não mandar esta cambada de músicos borda fora?
Um abraço infernal!
Peter, hoje venho so deixar te um beijinho.. n me esqueci deste blog:)
com mais tempo venho te ler.
Beijo meu,
Lúcia:)
Uma análise profunda e mordaz da situação a que chegamos... hoje que anunciaram lucros de milhões de Euros diários aos principais bancos nacionais...
Boas Férias!
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