Quarenta
Por vezes há pequenos nadas que nos lembram episódios da nossa infância. Coisas sem importância, pequenos nadas, como já disse, mas são eles que constroem a nossa vida e a tornam diferente de qualquer outra.
Nasci e fui criado na província no seio de uma família patriarcal, em que os meus pais acolheram os meus avós e todos vivíamos em comunhão, bastando-nos a nós próprios:
- o pão era feito em casa, matava-se o porco e faziam-se enchidos provendo carne e toucinho para todo o ano, pelo S. João compravam-se os queijos de ovelha, que eram guardados em grandes potes de barro, tal como as azeitonas, a criação fornecia-nos a carne branca, os vegetais, legumes e fruta, cultivavam-se no quintal e a água provinha do poço.
O tempo corria mais devagar e eu aprendi a ler sózinho. Aos 4 anos já lia BD e ansiava pela saída semanal de "O Mosquito", que custava $50. Não faço a mínima ideia do que isso representaria hoje em Euros. Possivelmente nada ...
A minha mãe, no intervalo das lides domésticas, ajudava-me nos estudos. O pior eram os números, era o contar. Começava e ia por aí fora, mas quando chegava aos 39 parava.
Era então que a minha avó gritava lá da cozinha:
- "Ali Babá"
E eu imediatamente dizia:
- "Quarenta"
Parece que adivinhava que esse número é a barreira, a entrada nos "entas", dos quais nunca mais se sai.
9 Comentários:
ahahah... mas que maravilha!
Adorei ler esta pequena estória familiar... e não só... pois é... os "enta"... será que fazes anos hoje? Sinto aí uma certa nostalgia... ou é impressão minha?
Beijo e um sorriso ;)
(ah... já está novamente linkado.)
Peter
Deste a este belo texto -cor - aroma e também um pouco de nostalgia.
Será dos "entas"?
Beijinhos
Olá adorei este texto. Chegaram-me aqui os aromas de todas essas iguarias caseiras o queijo de ovelha, as azeitonas... e parei na cozinha de fogão a lenha da minha avó e no almofariz de madeira onde se moia o sal com alho... uma das minhas tarefas preferidas. Uma delícia Peter.
Beijo
nunca mais se sai, mas a gruta do Ali Baba continua repleta de tesouros para desfrutar. ora essa!
gostei da historia. muito bem urdida. abraços
Quando chegamos aos "entas", acontece-nos tudo aquilo que sempre desejamos e tudo aquilo que nunca sonhamos que nos poderia acontecer, é uma reviravolta total na nossa vida, pelo menos assim conteceu comigo,mas para a frente é que é o caminho.
Um abraço
QUE SAUDADES DO ALENTEJO DA MINHA TENRA INFANCIA!!!
E...QUE SAUDADES DO *ALENTEJO* NAS MINHAS FERIAS, NO TEMPO (que tempo???)EM QUE EU PODIA TER *VERDADEIRAS FERIAS*!!!!!
AH! QUE SAUDADES DE MEU AVO!!!!
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BASTA DE *SAUDADES*!!!!!!
_OBRIGADA PETER*!!!!!
OBRIGADA! e, deixei la' no Heloisa palavra de agradecimento!
_Abraco AMIGO e..."Saudoso"!!!!!
Heloisa
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Olá!
Bonito texto rememorativo.
E sabe tão bem recordar, não é?
(será sinal de velhice?)
Obrigado pelo comentário.
Um abraço
A vivência da tua meninice que aqui muito bem retrataste, muito idêntica à minha, faz-me pensar que as crianças criadas nesses ambientes terão, tendencialmente, uma estrutura mental e cultural superior às das cidades.
Mas fica calmo, porque é nos "entas" que se pode viver mais e melhor, dada a experiência acumulada.
Um abraço.
Adorei este texto! Nostálgico e doce. Lindo!!
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