quarta-feira, outubro 4

Quarenta

Por vezes há pequenos nadas que nos lembram episódios da nossa infância. Coisas sem importância, pequenos nadas, como já disse, mas são eles que constroem a nossa vida e a tornam diferente de qualquer outra.
Nasci e fui criado na província no seio de uma família patriarcal, em que os meus pais acolheram os meus avós e todos vivíamos em comunhão, bastando-nos a nós próprios:
- o pão era feito em casa, matava-se o porco e faziam-se enchidos provendo carne e toucinho para todo o ano, pelo S. João compravam-se os queijos de ovelha, que eram guardados em grandes potes de barro, tal como as azeitonas, a criação fornecia-nos a carne branca, os vegetais, legumes e fruta, cultivavam-se no quintal e a água provinha do poço.

O tempo corria mais devagar e eu aprendi a ler sózinho. Aos 4 anos já lia BD e ansiava pela saída semanal de "O Mosquito", que custava $50. Não faço a mínima ideia do que isso representaria hoje em Euros. Possivelmente nada ...
A minha mãe, no intervalo das lides domésticas, ajudava-me nos estudos. O pior eram os números, era o contar. Começava e ia por aí fora, mas quando chegava aos 39 parava.
Era então que a minha avó gritava lá da cozinha:

- "Ali Babá"

E eu imediatamente dizia:

- "Quarenta"

Parece que adivinhava que esse número é a barreira, a entrada nos "entas", dos quais nunca mais se sai.

9 Comentários:

Às 04 outubro, 2006 13:47 , Blogger Menina Marota disse...

ahahah... mas que maravilha!
Adorei ler esta pequena estória familiar... e não só... pois é... os "enta"... será que fazes anos hoje? Sinto aí uma certa nostalgia... ou é impressão minha?

Beijo e um sorriso ;)

(ah... já está novamente linkado.)

 
Às 04 outubro, 2006 17:10 , Blogger Fragmentos Betty Martins disse...

Peter

Deste a este belo texto -cor - aroma e também um pouco de nostalgia.

Será dos "entas"?

Beijinhos

 
Às 04 outubro, 2006 21:04 , Blogger Papoila disse...

Olá adorei este texto. Chegaram-me aqui os aromas de todas essas iguarias caseiras o queijo de ovelha, as azeitonas... e parei na cozinha de fogão a lenha da minha avó e no almofariz de madeira onde se moia o sal com alho... uma das minhas tarefas preferidas. Uma delícia Peter.
Beijo

 
Às 05 outubro, 2006 00:19 , Blogger Manuel Veiga disse...

nunca mais se sai, mas a gruta do Ali Baba continua repleta de tesouros para desfrutar. ora essa!

gostei da historia. muito bem urdida. abraços

 
Às 06 outubro, 2006 08:12 , Anonymous Anónimo disse...

Quando chegamos aos "entas", acontece-nos tudo aquilo que sempre desejamos e tudo aquilo que nunca sonhamos que nos poderia acontecer, é uma reviravolta total na nossa vida, pelo menos assim conteceu comigo,mas para a frente é que é o caminho.

Um abraço

 
Às 06 outubro, 2006 15:27 , Blogger Heloisa B.P disse...

QUE SAUDADES DO ALENTEJO DA MINHA TENRA INFANCIA!!!
E...QUE SAUDADES DO *ALENTEJO* NAS MINHAS FERIAS, NO TEMPO (que tempo???)EM QUE EU PODIA TER *VERDADEIRAS FERIAS*!!!!!
AH! QUE SAUDADES DE MEU AVO!!!!
*****************************
BASTA DE *SAUDADES*!!!!!!

_OBRIGADA PETER*!!!!!
OBRIGADA! e, deixei la' no Heloisa palavra de agradecimento!

_Abraco AMIGO e..."Saudoso"!!!!!

Heloisa
************

 
Às 06 outubro, 2006 20:02 , Blogger António disse...

Olá!
Bonito texto rememorativo.
E sabe tão bem recordar, não é?
(será sinal de velhice?)
Obrigado pelo comentário.

Um abraço

 
Às 07 outubro, 2006 12:24 , Blogger Nilson Barcelli disse...

A vivência da tua meninice que aqui muito bem retrataste, muito idêntica à minha, faz-me pensar que as crianças criadas nesses ambientes terão, tendencialmente, uma estrutura mental e cultural superior às das cidades.
Mas fica calmo, porque é nos "entas" que se pode viver mais e melhor, dada a experiência acumulada.
Um abraço.

 
Às 11 outubro, 2006 15:36 , Blogger Maria Carvalho disse...

Adorei este texto! Nostálgico e doce. Lindo!!

 

Enviar um comentário

Subscrever Enviar feedback [Atom]

<< Página inicial