quinta-feira, maio 23

CONSTRUIR UM PAÍS


”Precisa-se de matéria prima para construir um País

A crença geral anterior era de que Santana Lopes não servia, bem como Cavaco, Durão,  Guterres, Sócrates e agora Passos Coelho. E o que vier depois deste também não serve para nada. Por isso começo a suspeitar que o problema está em nós. Nós como povo.
Nós como “matéria prima” de um país onde a ESPERTEZA é a moeda sempre valorizada, tanto ou mais do que o euro. Um país onde ficar rico da noite para o dia é uma virtude mais apreciada do que formar uma família baseada em valores e respeito aos demais.

Pertenço ao país onde o Estado e as empresas privadas são fornecedoras particulares dos
seus empregados que levam para casa, como se fosse correcto, folhas de papel, lápis, canetas, clips e tudo o que possa ser útil para os trabalhos de escola dos filhos... e para eles mesmos.
Pertenço a um país onde a falta de pontualidade é um hábito e onde os diretores das empresas não valorizam o capital humano.
Onde há pouco interesse pela ecologia, onde as pessoas atiram lixo nas ruas e depois reclamam do governo por não limpar os esgotos. Onde as pessoas se queixam que a luz e a água são serviços caros. Onde não existe a cultura pela leitura (onde os nossos jovens dizem que é "muito chato ter que ler") e não há consciência nem memória política, histórica nem económica. Pertenço a um país onde as cartas de condução e as declarações médicas podem ser "compradas", sem se fazer qualquer exame.

Um país onde uma pessoa de idade avançada, ou uma mulher com uma criança nos
braços, ou um inválido, fica em pé no autocarro, enquanto a pessoa que está sentada finge que dorme para não lhe dar o lugar. Um país no qual a prioridade de passagem é para o carro e não para o peão.

Como "matéria prima" de um país, temos muitas coisas boas, mas falta muito para sermos os homens e as mulheres que o nosso país precisa. Esses defeitos, essa "CHICO-ESPERTERTICE PORTUGUESA" congénita, essa desonestidade em pequena escala, que depois cresce e evolui até se converter em casos escandalosos na política, essa falta de qualidade humana, mais do que Santana, Guterres, Cavaco, Sócrates, ou Passos Coelho é que é real e honestamente ruim, porque todos eles são portugueses como nós, ELEITOS POR NÓS. Nascidos aqui, não em outra parte...

Fico triste. Porque, ainda que Passos Coelho fosse embora hoje mesmo, o próximo que lhe suceder terá que continuar trabalhando com a mesma matéria prima defeituosa que, como povo, somos nós mesmos. E não poderá fazer nada... Não tenho nenhuma garantia de que alguém possa fazer melhor, mas enquanto alguém não sinalizar um caminho destinado a erradicar primeiro os vícios que temos como povo, ninguém servirá. Nem serviu Santana, nem serviu Guterres, não serve Cavaco,  nem serviu Sócrates, nem serve Passos Coelho nem servirá o que vier. Qual é a alternativa?

Precisamos de mais um ditador, para que nos faça cumprir a lei com a força e por meio do terror? Aqui faz falta outra coisa. E enquanto essa "outra coisa" não comece a surgir de baixo para cima, ou de cima para baixo, ou do centro para os lados, ou como queiram, seguiremos igualmente condenados, igualmente estancados....igualmente abusados!

É muito bom ser português. Mas quando essa portugalidade autóctone começa a ser um empecilho às nossas possibilidades de desenvolvimento como Nação, então tudo muda...

Não esperemos acender uma vela a todos os santos, a ver se nos mandam um messias.

Nós temos que mudar. Um novo governante com os mesmos portugueses nada poderá fazer. Está muito claro... Somos nós que temos que mudar. Sim, creio que isto encaixa muito bem em tudo o que anda a nos acontecer: desculpamos a mediocridade de programas de televisão nefastos e francamente tolerantes com o fracasso. É a indústria da desculpa e da estupidez.

Agora, depois desta mensagem, francamente decidi procurar o responsável, não para castigá-lo, senão para exigir-lhe (sim, exigir-lhe) que melhore o seu comportamento e que não se faça de mouco, de desentendido. Sim, decidi procurar o responsável e ESTOU SEGURO QUE O ENCONTRAREI QUANDO ME OLHAR NO ESPELHO. AÍ ESTÁ. NÃO PRECISO PROCURÁ-LO EM OUTRO LADO.

E você, o que pensa?... MEDITE!

(este texto é uma adaptação de EDUARDO PRADO COELHO publicado no “Público”)

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